30 de abril de 2005

esquiços de dança

Desenho uma sombra,
não a tua,
não a minha,
a que nos intersecta…
É quase colorida e dança ao som dos búzios…

29 de abril de 2005

escultura

Esculpi um muro, em pedra de xistos molhados com brisa de mar, e espreitei …
Vi um campo enorme, com fim no horizonte em tons de verdes, vermelhos, amarelos, violetas e brancos, todo pintado ás pintinhas num desfocado de névoa…
Estranho muro este que se atou a um horizonte que se escondia no seu existir

In “apontamentos para um manual da inquietude”, ou como devemos ter muita atenção ao gesto, porque nele nasce e morre um outro mundo que lhe vive preso nas (inter) dependências do acaso...

28 de abril de 2005

quebra-cabeças

Inventei um quebra-cabeças para me desinquietar, o sol estava divertido, o céu no seu lugar, até as gaivotas se passeavam entre os horizontes…
Tudo indicava que hoje o desenho seria coisa viva, de cores quentes e traços sentidos, mas não, dei comigo a procurar a metade da minha alma.
O ponto exacto que a divide no meio de mim ( e a culpa é da Sophia “metade da minha alma é feita de maresia…”, que encontrou a sua).
Primeiro usei o numero de ouro, o tal das proporções e que nasceu com a vida, depois com o desenho e só mais tarde com o numero.
Perdi-me!
A minha alma não tem proporções, é desarticulada ( anda aos saltinhos só para me confundir…), por isso não lhe encontrei a metade, nem o terço, nem o um.
Já à noitinha resolveu serenar-me e segredou-me, brincalhona ” como podes encontrar a metade se ainda não me conclui no um?…o inacabado não tem metade, porque a metade cresce proporcionalmente com o um…"( ainda bem que não sou matemático, porque senão lá se ia outra vez a serenidade para a gaveta, na tentativa de formular a teoria do crescimento da alma).
Inventei um quebra-cabeças…
É bem feito, o dia ofereceu-te todas as cores para o teu quadro, escusavas de andar por aí a quebrar-te só para encontrares a tua metade…

27 de abril de 2005

conversas sérias

Entornei uma mão cheia de palavras sobre o papel, sem desenho nem limites ( papel-horizonte-de-bagos-de-arroz).
Falei com cada uma delas, sem lhes ferir susceptibilidades ou liberdades…
Cada qual sente o que sente e toma a forma que entender, mas era dia ( nunca devemos adiar a conversa, mesmo que seja, com as palavras que esvoaçam connosco o caminho do Ver) de sabermos, eu e elas se cada um cabia dentro de cada qual, na existência de cada um.
Foi conversa séria, mas delicada.
Quando se derramam todas as palavras que digam, com ou sem letras “AMOR”, é como pegar borboleta, se a “aprisionamos” pelas asas, transforma-se logo em pó(len?), mas se a deixamos pousar, nem que seja só no olhar, sentimos todas as suas cores por dentro*…


* "amar por dentro", ideia escrita e sentida por Ana ( in Ana e o tio Deus de Fynn - editora Ulisseia, reeditato pela Presença)
** sentires diferentes com a coincidência do mesmo olhar (tinta permanente)

26 de abril de 2005

fado

Cavalguei, noite dentro,
nas cordas de uma guitarra,
que me cantava, baixinho,
o choro de uma cigarra.
Toco a guitarra, sozinho
uma saudade triste,
dos tempos
em que me viste,
misturado na cidade.
Não é fado,
nem, poesia
é um querer sem tamanho
de estar sempre a teu lado.
Toco a guitarra sozinho,
na noite escura,
ao luar,
choro, com ela, devagarinho,
um sonho alado,
a rezar.
Soubesse eu cantar,
e ia por todo lado,
tocar esta dor,
que se desenha no ar,
num abraço negro,
da minha capa
a chorar…

( saudades...não há saudades sem fado )

25 de abril de 2005

voares

Guardo o dia,
este,
os outros também,
porque o sentir,
é esta essência de ser,
mais que palavra,
mais que o querer…
É ir,
sempre além,
como gaivota,
livre de nascer,
todas as coisas,
que só o pensar sabe ter…

(queria escrever sobre a liberdade, coisa singela, coisa simples, mas só me apetece voar...)

24 de abril de 2005

quando a cor se perde com a vontade

O céu enrugou-se de veios brancos.
Apetecia-me alisá-lo de azuis para o ver inteiro.
Perdi-me na vontade, é tarefa de gigante imaginar um céu por inteiro, não tenho azul que chegue no olhar...

22 de abril de 2005

monólogos inconsequentes

…e quando de repente, olhamos algo que nos foi intensamente belo e não acreditamos na banalidade dos seus traços?
O que se perdeu?
O belo ou o olhar?
Perdeu-se o instante!

In “ apontamentos para um manual da serenidade” ou como não devemos cansar o belo, para que ele não fique para trás, sem folgo para nos acompanhar, ou se não quiseres perder o belo não deves andar nem devagar nem depressa, mas abraçá-lo em ti...

21 de abril de 2005

ser-se no EU

Ser coerente no caminho que se traça no dizer( ou no ser), não é ter sempre a mesma opinião.
O importante é que o que lhe dá forma (sentir, ver, ou coisas outras como a cor ou os silêncios), faça sempre parte do teu desenho e que cada Sim, que cada Não, te defina sem equívocos o NOME!

In “apontamentos para um manual da serenidade”, ou como devemos andar sempre ás voltas com um continuo interrogar para não cair involuntariamente fora do papel, ou como um esboço já diz tudo do nome de quem o sentiu no lápis...

20 de abril de 2005

revolta suave, porque não nos podemos zangar por coisa tão pouca

O "poeta" falou-me!
Autoritário!
Estava tão zangado que o ouvi mudo e fui cabisbaixo, olhar o mar e a imaginar no desenho, a melhor forma de pintar um caracol surrealista de formas cubistas, sem poema, só para o arreliar.Isto de se dar ouvidos a poetas surrealistas, é grave e perigoso e só se o deve fazer se estivermos preparados para não interrogar…
Eu não estou.
Aguente-se o poeta, com boina ou sem boina.
Eu Pinto, não escrevo.
O que me sai do olhar, não são palavras, nem rimas, é desenho.
Nem sempre tem cor, é verdade, mas tem todos os traços escondidos em mistério, (como um-vitral-de-uma-floresta-a-permitir-se-embalar-na-luz), (isto por exemplo, é desenho-directo-do-olhar, é, sem mais, uma emoção, um sentir-ilustrado)...
Que se afogue o poeta e o seu latim.
Aqui, deste lado sente-se com o olhar,...
Aqui, não há paramentos, nem regras, nem mesmo surrealistas...
Aqui há um vazio cheio de mim que corre qual rio, com margens pintadas de EMOÇÃO !
Aqui há um su-emocionista (*) que vezes pinta, outras desenha, outras ainda e muitas, imagina, nem que sejam palavras, mas é tudo olhar transformado com o SENTIR.
É TUDO TRANSFORMAÇÃO...

(*) Não encontro palavra, como seria de esperar quando se pretende resumir o que há para lá da emoção do sentir numa única palavra, mais a mais inexistente, mas se há surrealistas...

Nota: isto não é um manifesto, é um desabafo com metáforas mais ou menos disfarçadas que nunca atingirão o alvo, mas ficam escritas e não se fala mais no assunto...

19 de abril de 2005

a tarde! ou.. é tarde? ou...

A tarde cansou-se de me esperar e foi por aí, sem saudades à aventura, sozinha.
As tardes são coisas estranhas (os dias, as noites, também, mas as tardes refinam na subtileza do mistério…) que se desdobram (qual caleidoscópio) na vida e para a vida de cada um…
A que me coube em sorte foi irreverente e não esperou por mim…
Azar só dela (perdoem-me a arrogância, mas como a tarde é minha dou-me a esse desvario) porque partiu cega e andarilha, presa ao umbigo do meu olhar.
Podia ser rancoroso e deixá-la ir assim sem mais nada, cortando-lhe o cordão (umbilical) mas corria o risco de ela se perder e eu ficar irremediavelmente desorientado na vida, sem uma tarde e olhem que isto de se passar da manhã para a noite é coisa de gente mal encarada com a vida e eu não me permito sê-lo, porque curta. Sei-me de missão encontrar todos os dias uma cor nova, tarefa de todo incompatível com desencontros voluntários com a vida…
Sei que a culpa é minha, ela (tarde) fez tudo para me realinhar com o tempo, mas eu estava tão entretido a escrever um manual prático de como se guardar o pôr-do-sol no bolso (para uso imediato e em qualquer hora do dia) que me distraí.
Não encontrava descoberta convincente para conservar a cor.
Estava indeciso em envolver o pôr-do-sol entre pétalas de rosa ou entre reflexos-de-olhar-de-menino-a-falar-com-a-sua-estrela.
Optei pela segunda e corri a agarrar a tarde…

18 de abril de 2005

mentiras descuidadas

Menti descaradamente!
Disse a uma gaivota triste que me sussurrou a sua vida, que parecia uma papoila a contar histórias…
Louco!
Irresponsável!
Indigente de sentires!
Uma gaivota não conta histórias, mesmo que vestida de papoilas !
Toda a gente sabe que uma gaivota é uma caravela navegante, branca que voa sobre o mar e o que ela sabe, não é história, é olhar…


"Eu já falei com uma gaivota e ela contou-me histórias. Mas como não acreditei nela, fui obrigada a segui-la. E ela mostrou-me que era verdade..."
testemunho deixado pela Cakau

Afinal andava enganado, ou pelos vistos o olhar, pode ser contado ( o que me leva a concluir que menti na mesma! Louco! Irresponsável! Indigente de sentires! Uma gaivota conta histórias sim senhor! Bem me pareceu que eram descuidadas as minhas mentiras...)

17 de abril de 2005

teorias

A beleza das coisas (Bc) é directamente proporcional à beleza da alma ( Ba). Esta é uma verdade indesmentível e que não tem discussão.
É a minha primeira verdade!
Ou seja a beleza da alma está para a beleza das coisas, assim como o UM está para a alma (nossa incógnita),donde
a = Bc x UM / Ba

a = alma
UM = ver teoria ( clicar em UM)
Bc = beleza das coisas
Ba = beleza da alma
Então, se:
Bc = Ba,
temos,
a = UM

donde , devemos todos tratar muito bem da nossa alma ( mesmo que seja incógnita) para não estragar o UM

In “ apontamentos matemáticos para o manual da serenidade “ ou como de vez a vez, vale a pena iludirmo-nos que esbarramos com uma verdade…

15 de abril de 2005

passeios desatentos

Há dias assim (gostava de saber quantas vezes me ponho a pensar em escrito, desta forma pouco criativa…há dias assim, ou hoje o dia…, mas não me vou perder em matemáticas…), dizia eu, e lá vou repetir-me... Há dias assim em que nos enamoramos pela brisa e fugimos com ela.
Fomos! Sem início nem fim (estávamos desatentos e quando demos por isso já era tarde, que isto de amores é coisa esquisita), transformados em folha de Outono, iludidos pelo poeta que se levantou hoje e foi passear-se de boina preta sem aviso prévio…

14 de abril de 2005

o pássaro

Passou um pássaro negro a esvoaçar-me meio louco à janela e a pintar o céu de gritos roucos. Parecia um piano de cauda, desconjuntado a tocar sozinho…
Chamei-o!
Disse que não me podia atender, que andava meio perdido ( meio-louco) à procura do olhar, não do seu, que o sabia bem guardado, mas aquele outro que tinha que mostrar à humanidade, antes do céu se pintar de estrelas, porque senão, não iria haver sonhos nessa noite.
Fora um desastrado, encantara-se por uma borboleta linda, de-cores-violeta-rosa e num acto tresloucado oferecer-lhe o olhar que os pássaros tem que mostrar à humanidade e a agora não havia nada que salvasse a humanidade. Ele que era o guardião, estava agora desgraçado…
Espera! disse eu aflito, surpreende-nos… só precisas de te sentir borboleta de cores-violeta-rosa, verás que ninguém dá pela troca, anda, anda aqui, que te pinto… o sentir, esse é contigo, mas as cores...
Não dá, tenho que A encontrar, não se pode enganar o sonho, essa é a grande diferença entre o sonho e a mentira…
Nunca mais o vi...
Só me resta esperar pela noite e ver de que cor se pinta o meu sonho, talvez tenha encontrado a sua borboleta naquele prado lindo vestido de papoilas que se esconde, ali ao pé do horizonte…

Um livro não tem letras...

tem almas que nos transformam o sentir…
Uma cadeia de literatura surgiu na blogosfera portuguesa - o ex-libris da tugosfera -por iniciativa da Lique que a recebeu de outros. A Moriana passou-me o testemunho confiando que eu lhe daria seguimento. Assim fiz.
Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Queria ser um livro vagabundo que se passeasse na recolha de cada olhar, queria ser o sentir de cada folha, de cada história.
Já alguma vez ficaste apanhadinha(o) por um personagem de ficção?
Fiquei pelo poeta, personagem, Alberto Caeiro.
Qual foi o último livro que compraste?
Titânia – Mário Cesariny (histórias inconsequentes, surrealistas em jeito de poesia).
Qual o último livro que leste?
Leio vários livros, mergulho-me em cada um, mas só termino um de cada vez…o ultimo a voltar à estante foi a Catedral Verde de João de Aguiar.
Que livros estás a ler?
Ai! Estou a ler uma estante…
Poesia: Poema continuo de Herberto Hélder; Todos os Poemas - volume I de Ruy Belo; Poesias IV José Gomes Ferreira: poemas de Deus e do Diabo – José Régio
Ficção: o Jardim das Delícias de João de Aguiar; O Nosso Reino- Valter Hugo Mãe
Reflexão (?): O Livro do Desassossego – Bernardo Soares. Este, a reler, porque se esconde e é como a primavera, tem sempre cores novas de cada vez que se re-olha.
Diários: Diário V - Miguel Torga
Banda desenhada:Leonard (n.º 35) Le Génie Donne Sa Langue au Chat-Turk; Julius Corentin Acquefacques – La 2,333e dimension - Marc-Antoine Mathieu.
Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
Temos um problema de escolha, que se resolve facilmente, levaria apenas dois, os que me acompanham desde que leio com o olhar e que dormem junto pousados à minha mesa de cabeceira e que acordam ao ritmo das minhas insónias: poesias de Mestre Almada Negreiros ( porque tem a magia de me abrir janelas) e a Bíblia ( autores vários…), (Porque caminha...)
A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
à Blue Shell, porque me acompanha desde o primeiro post desta aventura na blogosfera e que escreve com o sentir...
à Barca de lyra, que navega em mares revoltos de encontros e desencontros ( não tem tempo eu sei, mas confio).
à Nanne ( contos de Vénus), pela sua sensibilidade e porque olha do outro lado do atlântico espreitando-nos com carinho....

13 de abril de 2005

insistências

O Eu, espreguiçou-se, p-r-o-l-o-n-g-a-d-a-m-e-n-t-e a fingir-se dono do dia.
Sorriu-se, divertido com os azuis atrevidos que insistem em se fantasiar em Caravelas sem destino que teimam em se orientar só com o olhar...

12 de abril de 2005

a medida de cada um

Papá, papá diz-me, porque estou sempre a voar? Porque ando sempre a fugir-me? Diz-me papá que eu ando tão perdido…
O sonho, meu filho, não é fuga, é um sorriso da alma que nos fortifica o querer…
Mas papá, diz-me, então porque ando sempre tão triste, e só me sorrio quando me invento?
Tu inventas-te? Finges-te?
Não sei papá, mas as minhas asas são desenhadas….
Mas meu filho, tudo que é desenhado com o sentir, existe-te, porque é autentico…
Papá, papá, mas eu não sei o que fazer com o sonho...
Não faças nada com ele, deixa que ele se dissolva no olhar e verás que cada vez que isso acontecer, cresceste no teu caminho…
Toma as minhas asas, papá. Não as quero mais…
Não as posso aceitar, meu filho, cada um só pode voar com as suas próprias asas, não se empresta o sonho… Guarda-as com carinho, porque foram elas que te trouxeram até aqui.
Papá, papá diz-me, porque é que quando voo sinto-me sempre tão sozinho…se tu também desenhas-te as tuas asas e voas, porque nunca te vejo no meu voar…
O voar é o teu questionar, apenas te ensinei a acreditar nas tuas asas, se assim não fosse perderias toda a capacidade de as usar, porque elas só funcionam com o sentir, e esse meu filho tem a medida de cada um…

11 de abril de 2005

mutações al-químicas

Não tenho pertenças.
Apenas o sentir e as suas sombras são meus (sobretudo estas, que me acompanham para lá do sentir...).
Tudo o resto, atravessa-me o Ver em velocidades descompassadas …

In “ Apontamentos para um manual de serenidade” ou como aprender a utilizar um filtro al-químico ( química da alma) que transmuta a matéria em emoções. Quanto mais lenta for a passagem, mais intenso é o sentir, maior é a nossa posse, maior o nosso património (mesmo que traga sombras. Não há filtros perfeitos, mesmo sendo destes, que não consta terem controlo de qualidade por manifesta incapacidade de se encontrar “padrão aferidor…), ou como afinal está ao nosso alcance a transformação da matéria em (tes) ouro…

9 de abril de 2005

ousar

Tenho uma mania absurda de falar com as árvores.
Não sei a causa.
Talvez o seu olhar, silencioso e permanente, quase eterno que se transforma em sabedoria omnipresente-de-sombras-cúmplices …
As árvores são pastoras de sonhos.
Discretamente presentes, olham-nos em abraços de mãe.
São uma espécie de guarda zeloso que nos permite a dádiva da liberdade, mas que nos olham e nos apontam sentidos, enquanto nos abrigam na sombra…
Oiço-lhes os murmúrios que se escondem em mim, apenas e só, por estarem ali, naquele preciso espaço que nos cruza o acaso, a existirem da terra, das raízes, da luz e do ar.
Uma árvore, protege-nos o sonho e do sonho…
Em criança, subia ás árvores para as ouvir, lá do cimo.
Hoje oiço-lhes as raízes.
É nas raízes que está a vida, não nas flores.
As flores são obreiras da vida, mas são as raízes que as alimentam, e no entanto estão ali a suportar, todo o peso da existência, escondidas nos silêncios-de-luz…
As raízes-da-alma, (nossas) também estão escondidas e temos, vezes muitas, a ousadia de crescer sem as ouvir…
Hoje a árvore que se dança no meu jardim, disse-me, sem segredos, toda autoridade, para experimentar viver um dia inteiro sem tempo…” só assim te podes encontrar…”, “ deixa que se misturem todos os instantes da tua vida, como se fossem um mar”, “ não te esqueças de estar atento, e ver em que cor ele se transforma…
Tentei!
Devo ter feito tudo ao contrário!
Só me vi menino, a brincar com todas as cores ao mesmo tempo sem me preocupar em dar-lhes nome…
Vou tentar novamente, talvez encontre outros instantes que se passeiam no rio…

8 de abril de 2005

nada

Não!
Quero ser, nada!
Hoje, não quero ser...
Tenho medo do poeta,
que se finge,
se pinta,
se inventa…
Pior que ser nada,
é este navegar,
sem sentido,
nesta fantasia lenta,
que mente
e
nos suja,
nos dobra,
queima,
e
esvoaça demente.
Não!
Hoje não vou enlouquecer,
vou andar por aí,
sem VER.
Sou abismo de mim,
na palavra do EU…
Quero Ser,
Nada,
sem temer…
Tirem-me o Vagabundo
Dispam-me D-E-L-E,
Tirem-me o Mar,
a gaivota,
tudo!
Levem todo,
num grito só,
mudo!
Mas devagar,
para não ficar nada no meu Ser…
Mergulhem-me no verde,
no azul,
no amarelo,
no branco e no preto,
sem pressa,
pintem-me todo,
esborratado,
engravatado,
não interessa,
e
soprem,
soprem-me todo,
Tudo,
pelo ar,
até ficar , nada.
Tudo muito bem apertado,
machucado,
Vazio!
Quero ser, Nada,
sem palavras
nem poesia…
Sossegado,
a deslizar sozinho pelo rio,
Hoje quero ser, Nada,
pássaro, sem assobio,
nevoeiro, sem maresia...
Ah! Nem o Eu me safa,
deste meu querer destemido,
de não ser barco,
nem vento,
nem cor,
nem gota,
nem fio
de água.
Nem janela sou,
nem papoila,
nem agonia,
nem pó,
Nada!
Não te escondas no EU, que até esse voo…

7 de abril de 2005

mar sem cor

Inundo-me de brancos e de lágrimas,
secas,
e desenho-as,
uma a uma,
transparentes.
Crentes.
Multidão sem voz
que caminha,
Vão em silêncio,
sem medo,
mas,
cada uma sozinha.
Fossem elas todas,
Um,
não haveria branco nem negro,
e lágrimas,
eram outras,
de alegria...

6 de abril de 2005

gaveta

Tenho uma gaveta cheia de violeta-quase-flor…
São pedaços de nada que viajam comigo,
para onde for.
É engraçada, esta minha gaveta,
porque afinal,
não tem nada…
Tem uma cor,
timida,
(res)guardada
Que parece dor…

afinal é para isso que servem as gavetas, mesmo as minhas que são desarrumadas, para (res)guadar, nem que seja um desenho de uma flor...

5 de abril de 2005

oiço...


Capto o silêncio da terra que se oferece em cores húmidas e que me fala pausadamente, (como se eu não lhe soubesse o falar),
conta-me os passos,
passados num eternamente longe.
Conta-me as viagens, as suas.
É terra navegante, esta que hoje piso e me fala dos passos pisados.
Foi amada, foi mãe vezes sem conta,
pisada e re-pisada também.
Mas conta,
conta-me,
cada grão,
cada nada.
Conta,
conta-me que grão só, não vale nada, só inteira tem história.
Oiço.
Oiço-a.
Oiço-me.
Em silêncio, no seu silêncio...

Vale do Sorraia - Março 2005

4 de abril de 2005

mar (és)



Deixem-me re-escrever o Mar, libertar todo este azul-esmeralda que há em mim, num abraço-labirinto...
Fundir-me, nesta névoa-de-azul-salgado e deslizar,
onda pelo ar
e...
lá no alto,
deixar de Ser e pairar-leve-só-sentir...

Mar(es) da Ericeira - Março 2005

3 de abril de 2005

ás voltas


"Moinho-me" na vida, com as velas,
todas,
a dançar...
Brilham ao vento,
no mar.
É moinho trigueiro,
que gira,
gira,
sem parar...
Fosse ele,
só vento, e não saberia a cor com que se pinta o ar...
Não,
não é azul,
nem cinzento,
nem verde,
é cor de onda,
de espuma,
de Mar...
Nem branco,
nem prata,
é cor do meu olhar...

Ericeira - abril 2005

2 de abril de 2005

obrigado, Karol

de branco,
fragil,
peregrino-homem...
Procurei-vos ! (disseste)...
Estamos aqui...caminhando...