31 de agosto de 2020

sombreados...

 Tenho uma sombra bailarina

(endiabrada,

diria!)

que flutua colorida…

Não é sombra qualquer,

(só por ser minha),

é sombra egípcia

que vagueia sozinha

empoleirada nas crinas-da-lua…

Vezes há que escreve e chora

(quando distraída, se deixa prender dentro dos olhos , que estasiados de danças e de letras, chovem gotas lindas,

violetas!)

30 de agosto de 2020

sombras

 Abracei, com a minha sombra, a árvore da cidade,

Cinzelei-lhe as cores, em matizes negros de mim e fiquei a ouvi-lhe a seiva do tempo…

murmurava,

gravida-de-histórias-de ventos,

com a lentidão do chilrear-dos-ramos,

para me embalar no sono e no sonho, na tentativa de encolher-me o abraço que a anoitecia…

25 de agosto de 2020

desassossegos

Apanhei uma pedra da falésia e aconcheguei-a qual buzio para lhe ouvir os ventos…

Estava indignada,

zangada,

por a ter acordado da eternidade e lhe ter trocado o destino…

24 de agosto de 2020

pinturas por colorir

 Na véspera-da-noite, pintei uma enorme janela com um mar imenso dentro, a refletir estilhaços de espelho-prata, a cintilar-me nos olhos desenhos-vestidos-de-sol-nascente.

23 de agosto de 2020

demolições

 Hoje,

derrubei o dia à martelada.

Abri um enorme buraco,

queria tanto ver o que se passava no desdia

Espantado 

( maravilhado?), 

deparei com uma enorme tela vangogueana a ondular-me  o existir...

 

desdia= o que vive no lado de lá do dia

22 de agosto de 2020

caminhadas

 Caminho nas memorias, como quem olha para uma tapeçaria de sedas finas, estendida além-horizonte.

Evito os passos, para não a enrugar, não vá perder-me,

(Afogar-me?)

ou transportar-me para-o-de-lá-de-mim.

É preciso muito cuidado quando visitamos as memórias…

21 de agosto de 2020

psicanálise de um labirinto

 Por vezes,

(muitas)

caio num labirinto-de-mim, como quem escorrega num quarto escuro e perde o sentido da porta,

 no caso,

da porta-de-mim.

Não sinto angustias ou desesperos.

Nesse instante transformo-me em descobridor,

em explorador de mundos perdidos, permitindo-me a aventura de me reinventar…

Quem perde a porta de si, pode ser qualquer coisa e nada o poderá surpreender, mesmo que se mimetize em sombra,

em borboleta,

gaivota ou serpente.

Quando tropeço nesse labirinto,

e me mergulho inteiro nele,

sou certamente um mau pastor de memórias…

Transformo-me em garimpeiro,

mineiro -de-mim,

sem saber se procuro cristal, ou fóssil,

 se a luz do túnel,

ou simplesmente as aguas do rio.

Nestes momentos sou certamente exemplar de estudo para um psi, seja ele quiatra, ou cólogo  ( não lhes sei as diferenças de oficio, provavelmente o primeiro é um lapidador de cristais, ( ferreiro de cristais?) e o outro um polidor, mas certamente ambos ourives da mente).

Vezes há

(algumas)

que neste estado, perdido de mim e em mim,

jorro palavras de sangue,

não que sinta dores,

raivas,

tumultos, ou intranquilidades…

Estas palavras-sangue, fluem na procura e alimentam-me a descoberta, mantendo-me atendo à realidade-nua-e-crua-do-sonho…

20 de agosto de 2020

desidratações

 Parei,

(tropecei na angústia, e no perfume dos crisântemos),

desorientado,

cansado,

perdido,

(assustado?)

Suei todas as palavras,

( pelos poros-dos-olhos)

Todas,

no calor-da-fantasia, 

e  entrei assim no deserto,

despalavrado.

Preciso urgentemente de beber um poema,

de um só trago,

de vez só,

fundido na seiva de mim,

(como quem bebe o universo à noite,

na luz das estrelas).


17 de agosto de 2020

cidades hostis

 Percorro os sentidos inóspitos da calçada da cidade

 (vitrais de sombras-coloridas),

caras escondidas?

ao som das vozes

(passos de fuga de cada um, a esculpir- vidros,)

oiço, 

em sinfonia, 

cada uma das fugas,

bramidos na surdez dos silêncios…

15 de agosto de 2020

brincadeiras

 

O bailado-da-memoria tateia o tempo…

ela,

é uma espécie de girassol envergonhado dos voos noturnos e que se “girafa” em sorrisos-trocistas, a brincar com as sombras-concavas, (do eu) no zénite das manhãs de azuis-esquecidos…

14 de agosto de 2020

ciencias

 Não tenho ciência(s),

tenho uns olhos-saltimbancos, a sondar descoberta(s) que respiram fluxos-de-cores que circulam no coração-das-árvores e na seiva-das-estrelas que desaguam na luz-da-lua,

(que me segredam as direções para onde vou, deslumbrando por ir…)

 

13 de agosto de 2020

sentinela

há uma sentinela-borboleta, ao fim da rua, a tocar violino 

( austera, atenta, concentrada, 

linda!)

Só passam para de-lá (dela),

o vento , 

as cores  

e o perfume-do-sorriso,

o que sobeja

fica ali  sentado

à espera de uma distração ... 

12 de agosto de 2020

esculturas de areia(s)

Gravo,
nas areias, o bailado dos olhos,
como folhas de outono matizadas de sol-cansado.

Os roços sorvem os rios na angustia de navegarem entre as fronteiras da pele da terra.

Sou um agricultor (efémero) de nascentes...

11 de agosto de 2020

transporte


No cinzento do sol, navega um moliceiro-vagabundo, a semear caminhos.

Segue, 

enfolado, 

sem pegadas. 

Leva na luz-das-velas, 

o tempo. 

Transporta-o no silêncio-dos-labirintos, 

como se carregasse o tesouro do universo nas asas de um colibri.

10 de agosto de 2020

vulcanizações do olhar

 


Fumo, em respirares serenos, a luz-da-rocha,

(áspera!)

Nos poros, afogueados de agustias, suo os grãos da terra,

(vermelha!)

Que se evapora no sangue

(ácido!)

E bebo em saboreares lentos, o tempo que levita na neblina,

(suspenso!)

 Só os olhos caminham para além…

 

Que se evaporam no sangue= viagem no interior do eu, incluindo na bagagem de viagem as angustias, que me aquecem os passos ( no entanto… os olhos caminham para diante, para o exterior do eu, como se o magma implodisse e se transformasse em cicatriz de pele)

Toda esta geologia tem uma explicação, passeio-me todos os dias pelas falésias da Ericeira, cenário destes escritos de verão costeiro, onde a neblina me acompanha o horizonte

 

6 de agosto de 2020

estendal



hoje, 

o horizonte levitou , em linha outra, acima do mar,

a linha que desenhou parecia um estendal a convidar-nos a pendurar os sonhos a secar…


5 de agosto de 2020

no mercado

De manhã, no ainda quase-noite, fui ao mercado procurar palavras.

havia muitas  (frescas, quase todas,

coloridas,

profundas,

leves,

agrestes,

meigas,

severas,

doces até),

gostei de muitas, mas não encontrei nenhuma das que preciso…

4 de agosto de 2020

paisagens

A paisagem que ondula no coração-das-estrelas, transmuta-me em voos-semente.

perco-me entre a falésia e o sopro-do-mar, que me chama em azuis-rudes,

 violentos quebrando-me o corpo e os passos,

trituram-me a membrana-da-alma, como moinhos-sem-velas, a rodopiar desesperados na noite-da-lua, a ranger-destinos-esculpidos-em-madeira-seca.

membrana-da-alma=fronteira entre o olhar e o ver

 


3 de agosto de 2020

no caminho das águas

Há homens-golfinhos a engomar as ondas no horizonte,

fogem dos azuis, do nada, e dos próprios homens, ébrios de liberdade e do Deu que caminha nas águas,

Entre eles e o mar há um abismo que sorvem, 

sedentos de se cruzarem nos instantes do EU que se fragmenta na espuma das nuvens…

Há homens-pássaros cansados de voar, que pousam na escarpa a descansar o olhar.


2 de agosto de 2020

retrato do nascimento de um poema

Liberto-as (palavras?)

escoo-as no ar (evaporadas?)

e sento-me no suor-das-rochas a absorver neblinas (letras?).

neste ciclo de respirações, transformam-se de mim( elas?),

como quem procura uma semente,

um som.

um eco,

um reflexo,

Oculto em mistérios purpúreos que transformam o corpo-translucido …

Corpo translucido=poema que desenha as palavras com a realidade do instante, à procura do equilíbrio e de um caminho = movimento do caos das letras ao encontro da poesia…


1 de agosto de 2020

a pele do tempo

A crosta da terra invade-me o pulsar da respiração das cores,

a pele da rocha (os poros da falésia?) ondula ao vento a sussurrar os segredos do tempo,

em que cada instante se liberta em eternidade…

 

 

pulsar da respiração das cores = o que a imaginação vê!

o instante que se liberta em eternidade  = ao ponto que sente ser simultaneamente, o centro e o todo ( o UM!)