tenho uns olhos em forma de lápis, mas nem sempre de cor... Sei que sou esquisito mas a vida moldou-me assim... ganancioso de SER por inteiro e não me caber por inteiro em mim.
31 de maio de 2006
30 de maio de 2006
ainda os azuis...
Um em cada janela!
É como a VERDADE!
In “ apontamentos para um manual da serenidade”
ou
como deves rodar-te para veres o outro de ti,
ou
o outro do outro
ou
simplesmente para veres o mais belo!
O outro!
29 de maio de 2006
intrusos
R-E-S-P-I-R-A-TE,
na inconsciência de TE seres,
intenso….
D-E-R-R-U-B-A-TE
no HOJE,
que não TE conhece,
e
VOA
do imenso que TE esmaga
e
apodrece,
esfumado
no aroma
e
no incenso
da sombra que TE anoitece!
I-N-T-R-U-S-A de TI!
26 de maio de 2006
em trabalhos de contar numeros com existires
Todos juntos, desenham-me o NOME!
Sem eles (anónimos e passos) não me existia!
25 de maio de 2006
quando calha a minha vez de pintar o "quase" em desenho de mim
fiquei a olhar o desenho (quase-dança), de um dia inteiro, em que ela me percorre o corpo (quase rio), ao som de uma guitarra…
no desfim, (da quase-linha)
despi-a
e
adormeci-a na noite de mim…
24 de maio de 2006
nos passos que dou
(vagabundo),
a olhar as coreografias-do-um
e
fiquei perdido de olhos-abertos, no maravilhar do EXSTIR…
23 de maio de 2006
Definições oníricas
22 de maio de 2006
o gosto para de lá da palavra que lhe diz o sentido
Eu gosto, até da palavra porque rima em MIM…
Gosto,
Apesar da dor da ausência que provoca quando se enche de silêncios…
Gosto,
Mesmo sem eles (silêncios) porque para haVER FIM, criou-se caminho,
e
sem ele não há VER “de começar”…
Devia ser VERbo “ de existir” a palavra que se sente FIM !
19 de maio de 2006
( des) prender-me ( de mim?)
rasgo o tempo informe que me atavia o querer SER mais do que posso
e
deixo-me ser rio.
Evaporo-me nuvem de um nada que me persegue sombra
e
vou sem a liberdade de me perder em mim.
Nem em mim me quero!
Só assim me sou!
18 de maio de 2006
notas semi-fusas
17 de maio de 2006
desenho de uma borboleta
silhueta-alada,
de mulher,
nua,
despida…
traço único,
inteiro,
de
borboleta-alva,
colorida…
desenho, em aguarela-lágrima,
cabelos-crina,
escoares de vida,
em tinta,
sépia,
perdida…
16 de maio de 2006
recomeçar na deslembrança
15 de maio de 2006
escritas
(o que se dizem nos sussurros de se serem um, escrevem-no em sombras...)
13 de maio de 2006
(des) saber
Não me sei nas horas, Mas espero que o tempo chegue e me respire, Só depois dou um passo, gravado no dia.
Pegada invisível de alma, Física, Com hora, Qualquer, que o tempo é qualquer, repetido até ao infim…
Só eu não passo, Preso.
O dia, esse vai, desabrido de mim, Não me espera. ( por isso não O sei, nem às horas…)
Repito-me, No que escrevo, Como o tempo se repete, Em mim, Parado, (Des)sentido. (o tempo pára, como eu, porque se repete, Só quando cria, ou se reinventa, avança)…
Ah, como é azul este espiar-me do sonho, e ver-me sentado, Parado, À espera (de mim? do tempo? do novo? dos passos? )…
Pareço um amolador de facas ( Existem? Ainda? Ou só se vivem no sonho-memória que se me passeia nos passos?) que perdeu a gaita de sopros, desafinada ( desafiada?)…
Não sei horas, Repito-me.
Tropeçam nas letras que escrevo, São elas, as letras que me marcam o compasso do dia…
( Como se mede uma gota de letras que se escorrega em ampulheta de papel? Não sei!
(Des)respiro-me em desinteresse do o saber, para me poder sentir nos passos que se dançam sem horas…)
11 de maio de 2006
dores de olhares

(fotografia de Patricia Sucena de Almeida)
Dói-me.
(Não sei o quê… )
Dói-me,
a palavra e o olhar.
Cousas estranhas de se doer. Mas a imagem anda por aí,
demente,
a explodir em palavras.
Elas à frente.
Foi ele (olhar) que explodiu,
nelas.
Elas ficaram doidas e sem sentido.
Estão magoadas,
sentidas…
Não foram avisadas que seriam assim expelidas em estilhaços de orvalho (redondos) da imagem. (Só pode ser uma imagem cubista... Cubista e suicida!)
Não há nada a fazer quando nos explodem os olhos,
rebentados de Ver!
Vou fechá-los, para as palavras sossegarem e se deixarem de dores…
10 de maio de 2006
descidas, ou a ilusão de uma subida...ou coisa nenhuma
Subi ao sol e morri…(de mim?)
In “apontamentos para um ( ou dois?) manual da serenidade”, ou como a dimensão da nossa subida, não deve nunca perder a linha do horizonte, ou como só devemos subir até onde os nossos olhos alcançam… Quando o horizonte deixa de existir, é porque esvoaçamos em queda ( não conta que exista horizonte para de lá...)
8 de maio de 2006
o desenho de uma invenção
Era um homem, com toda a sua árvore. Também ela inventada. Nos nomes.
Era um homem encurvado para o céu.
Lia poemas nas nuvens como se eles ( poemas ) existissem!
Era piroso (pronto, o rapaz danou-se!).
Transportava todas as cores, vivas, atrás dos olhos, e desenhava-as, todas, nas gravatas, que usava.
Não há nada mais piroso que todas as cores. Vivas. Penduradas numa gravata. Mas lia poemas como se existissem. Como se fossem vivos. Os poemas. Como se tivessem cores, Desenhadas, Nas nuvens. As cores desenhadas nas nuvens, mesmo que vivas, não são pirosas.
Era um homem esquisito.
Encurvado para o céu, com a gravata ( pirosa) a cair-lhe, pendurada pelas costas. Era um homem do avesso. Inventado.
Conheci-o. Hoje, mas o Hoje não tinha nuvens no céu. Era inventado. O Homem. talvez, só no Nome, ou nas cores com que lia os poemas no céu.
5 de maio de 2006
esvoaços
Disperso-me no aroma que invade ( sem licença ) o sentir de me imaginar um duende-de-ibis
e
fingir-me não-ser, (pedaço-mágico-do-invisivel).
Fantasma de mim,
como um seixo multicolor de um rio que se redonda em águas
e
se transforma em onda-colibri que esvoaça entre pólenes de rosas do deserto
4 de maio de 2006
sem ângulo
Seja qual for o ângulo, serão sempre nuvens,
ela
e
eu!
3 de maio de 2006
moagens de luz
( avisto,
ainda, terras de Marão dentro dos olhos que não me dormem…)
2 de maio de 2006
sussurro...unico
Desenha-A! Só!...”
Desenhei-A! Amarelo-Sol! Única! ( para que me queime o querer que seja. minha!)
30 de abril de 2006
quando o título* atrapalha mais vale por nenhum
* no original lia-se tutulo ( o autor estáva de lua...ou de cócoras)
28 de abril de 2006
em pedra
nos silêncios.
Abraça-me uma solidão inteira, do tamanho de um dia que não passa.
É um dia-pedra.
Imóvel,
surdo de noite-deserto…
Só as águas das árvores se ouvem-de-vida…
26 de abril de 2006
acordares
Lancei uma corda E-N-O-R-M-E até ao umbigo do Universo e fui, em devagares (meus) com um sonho (só) e fui…( como gosto desta palavra tão próxima do ir…)
24 de abril de 2006
prazeres de silencio
me=muito egocentrico
20 de abril de 2006
um pequeno nada
Pequeno (como o são todos),
Quase lilás-papoila ( cor de papoila triste ao fim do dia, antes de fechar e sem vontade de dar boas noites, ás amigas que resolveram não se deitar porque vão ao baile ás escondidas…de quem? não se sabe, é quase um nada, quase mistérios, mas estes mesmo sendo um nada, por vezes são grandes, porque desconhecidos…),
e
não sei o que faça com ele ( o NADA).
Desfaço-o
e
pronto!
Desenlaço de vez ( unica) este vazio que me tropeça na sombra e viro o dia![ como andam emperrados estes dias desnascidos sem cor, a pintar a primavera num embaraço (de um azul-quente-de-sol) desfeito…]
O horizonte ( de longe) foi abraçado por montanha*. Gigante. Aqui perto…num quase NADA. Pequeno…com sabor a água-de-nevoeiro-a-fingir-se-céu...
*avisto o Marão desta janela pequena ( quase um nada)
19 de abril de 2006
ausente
Ando de olhos-espelho, numa espécie de jogo de devolver a vida ( sem demasiada força, ao de leve, não fora ela ficar longe do alcance do horizonte).
Ando por aí em passos lentos, só meus, a respirar o universo…
13 de abril de 2006
desenrolar o dia
12 de abril de 2006
à procura de resposta
( assim, tal qual, com a admiração toda na voz, "Tu, não ouves o Sol? ")
Fiquei a mastigar resposta, intrigado por andar desatento.
Para O ouvir, era mais fácil se tivesse nascido flor-qualquer … (elas o-u-v-e-m o S-o-l… disse-me em segredo, e escondida da noite, uma gira-lua…)
eu,
ainda não descobri o som de cada cor...
11 de abril de 2006
respirares
6 de abril de 2006
os acasos que me escrevem os dedos
ah, fossem (só) azuis as palavras que me escrevem os dedos e eu era um mar de cores a pintar uma seara de girassóis a brincar com sombras de saltimbancos, a fazer vénias aos ventos alísios
5 de abril de 2006
subir aos azuis
lá,
depois de todos os verdes
o céu era inteiro de azuis,
eu,
uma formiga a fingir-se gigante…
4 de abril de 2006
pressas justificadas
Fui.
Decidido, a correr para o futuro , antes que ele me acontecesse…
3 de abril de 2006
escaladas

Dei com a descoberta dos dias em que passeávamos em família de carro ( vezes muitas apenas por aí, sem objectivos de chegada, apenas com a vontade de ir). Viajávamos o Ver (num Simca branco com uns faróis a imitar olhos em desorbita... ).
Oiço, quase nítido, a voz do Pai ( com a ansiedade toda de um instante que não se pode perder) dizer imperativo " Abram as Janelas!"
Aquele momento transformava-se num mundo mágico em que os cheiros de toda a serra ( árvores, terra, aves, formigas e coisas outras que tais) nos abraçavam a pele e os sentidos, à velocidade de um sorriso de uma família inteira a passear-se num velho carro com olhos esbugalhados...
Hoje, pergunto-me ( nesta inércia de dias que passam sem existir) porque não saíamos do carro e entravamos na serra, para nos deixarmos abraçar por ela própria ( sem a velocidade de um ir)?
Devia ser ( certamente o era) da pressa de chegarmos cedo a lugar nenhum ( cousas de vida moderna...)
30 de março de 2006
do avesso

29 de março de 2006
ao vento, com a loucura de Ser, ou a confusão de me passear vazio
NOTA: não podia deixar de ser confuso, até para quem escreve, pelo que se aconselha a não leitura e deixar que o dia passe...
28 de março de 2006
trilhos...
como quem se desembaraça do coração,
prendi-a
no leito,
no fundo do lodo,
(fria),
com as minhas próprias mãos,
tatuagem de um trilho,
ferida,
(rasgada no peito,
de um vagabundo de estrelas azul-mar)
nas aguas que lavam
a dor
de quem respira
o (a)mar
com o sentir do olhar,
em jeito de oração…
27 de março de 2006
sem paragens
nem um segundo
ou momento
que corra no seu silêncio
e
me leve no eu
qual cavalo sem medo…
ah, esta ânsia de ser futuro,
não hoje,
nem ontem,
AGORA!
JÁ!
livre do amanhã que me prende o presente….
25 de março de 2006
sem fado
selvagem,
sem fado...
fecho os olhos, para lhe sentir as águas-de-um-som,
que não é canto,
nem poesia,
corre qual rio, sem margens,
nem lado,
suspiro de ninguém,
pura fantasia,
som de além
que chora
sozinho
calado…
23 de março de 2006
(des)orientações
que,
cansadas
se deixam cair, exaustas de serem sonhos-de-anjos-sem-asas...
22 de março de 2006
ilusões do Eu
21 de março de 2006
apenas
uma
(só),
parecia cristal...
quase ,
caixa-de-cores-aladas,
escondida num vitral…
(andorinha-do mar?
sonho?)
apenas uma historia, que fugiu de um lápis a voar
É obrigatório Ir...
Dia 24
Jaime Reis
Hugo Ribeiro
Teresa
Gustav Mahler
César de Oliveira
Luís Soldado
Bruno Soeiro
Béla Bartók
20 de março de 2006
guardador de gritos
numa árvore,
sem raízes…
nos (des)passos,
que me antecedem,
mergulhei no vazio de mim…
insurrecto de existir…
17 de março de 2006
como quem cheira terra-humida-de-sol
e
a espalhar lágrimas de bolor-colorido por entre os vazios do universo, como quem semeia pirilampos-nas-noites-escuras-dos-sonhos-inacabados, em searas-de-grilos…
16 de março de 2006
as quietudes de um dia
a vida correu-me serena nas veias.
Devagar,
como um rio que se espreguiça ao Sol, sem pressa de chegar ao Mar
15 de março de 2006
as deslembranças
e
d’o brincar,
colando-o,
sem lhe pedir autorização ou obediência,
(adiando-o?) ...
[ganha uma espécie de liberdade que navega,
sem verdade
nem limite,
que transpira na pele, misteriosa-de-ausências,
( carente?)
como uma flor-rebelde
que se fecunda
ao sol
em voares
(suspensos?)
lentos
de um caracol,
pintado ,
irreal,
num desenho,
sem ponto final]
nota: devia existir um itálico inclinado… ao contrário, uma espécie de portucálico…
Informáticos, Inspirai-vos!
( assim sou obrigado ao que não gosto. usar parênteses rectos, como se coubesse matemática no que escrevo)
14 de março de 2006
o nascer de uma pedra
no chão!
assim,
do nada,
sem mãe
pai,
ou irmão!
intrigado,
peguei-A, como quem sente...
( de leve )…
estava quente!
( só podia ser do coração! )
(...estranho mundo,
este,
onde as pedras se vestem de pele, com o existir... )
13 de março de 2006
ensinar o desenho
Ensina-me a pintar com as lágrimas do Sol!
Ensina-me, depressa a pintar um Sonho, com a intensidade-inteira-de-quem-acredita…
Ensina-me Papá!
Tenho a urgência de um-agora, não vá Ele fugir…
Ensina-me papá, a desenhar a alegria-de-inventar-o-Universo-que-me coube-no-existir…
É tão urgente, papá!
12 de março de 2006
segredos
e
larguei-o
ao vento…
( ah, porque nasci na ignorância de saber desenhar a flor que nasce semente-do-que-me-vive-no coração!)
11 de março de 2006
aula...(des)conseguida
levantava-o aos céus,
e
largava-o,
(divertido)
mas,
teimoso
(e
livre),
transformava-se
em cabelos-de-chuva,
a fingir-se
de espuma
alva-de-onda,
branca-de-ave…
(gaivota?
nem uma!)
10 de março de 2006
cousas de aves ( ou de voares...)
e
levou-me,
pendurado nas nuvens para a terra-das-histórias-desenhadas, onde os homens se confundem com um violino-vagabundo-a-imaginar-se-menino…
(ah! fosse eu,
apenas o que sinto,
e
era de certo,
um flamingo,
peregrino…)
( o autor destas palavras escritas, tem quase sempre relutância em dirigir o sentido das palavras, mas vezes há em que ele, tem o seu próprio dicionário, escrito com o tempo, e direccionar uma palavra de vez em vez, é cousa que se perdoa, por isso aqui fica que terra-das-histórias-desenhadas, se refere a nuveares, onde todas as histórias desenhadas são aquelas que se vivem no olhar, sem a clara obrigatoriedade de serem Vistas, bastando tão só serem sentidas. donde se deduz facilmente que é terra-de-todas-as-hitórias-possíveis)
9 de março de 2006
se...
e
não estaria aqui a guardar palavras,
andava por ali,
eu-próprio,
a pastorar todas as cores,
que dançam,
a fingirem-se azuis!
fosse hoje dia de luz outra,
e
era
eu-o-rebanho-mesmo,
mascarado de flores-de-iris,
a voar sem ermo
nas asas de um colibri…
8 de março de 2006
gosto
( resume,
sintetiza )
numa
( simples )
gota de chuva que guarda todo o mistério de um Universo inteiro por descobrir
( é o meu gosto,
mutilado-de-passados,
mas
que se maravilha constantemente em adivinhares… )
uma gota de chuva, carrega no seu peso, toda a idade do Universo!
( por isso cai! )
A queda de uma gota de chuva, tem todo o movimento do Universo!
( por isso gosto! )
7 de março de 2006
espera
de sol
e de horizonte
à espera
ávido de descoberta(s)…
qual predador
de caça,
espero,
as palavras
vindas-da-primavera
sem que nada faça,
até que nasça,
história,
verso,
ou cousa outra
( quase nada )
que satisfaça
esta procura
de poeta
sem palavras…
6 de março de 2006
dançares
loucas,
de serem verdes…
dançam,
abraçadas ás nuvens
embriagadas de “sedes”
bailarinas?
não!
essas,
já partiram,
enfeitiçadas de “alices desenhadas em baralho de cartas”
(d-i-s-s-e-me,
em segredos,
borboleta-avó,
pintada de violetas,
que voava,
só,
dentro de mim)
Nota: sem correlação qualquer ao escrito ou ao sentido: “ as borboletas são pólenes a esvoaçar com desenho”
5 de março de 2006
perguntas, medidas, sem tempo...
Um ano. Um mês. Um dia. Uma hora. Um segundo. Medidos , todos os fragmentos entre círculos. Voltas do mundo sobre si mesmo. Rotações do nosso-pequeno-mundo…
E o sol?
Um ano de sol, quantos anos são do nosso-pequeno-mundo?
E um ano da Via Lactea, quantos anos são do nosso pequeno e ínfimo Sol?
Já imaginaram quantas eternidades são um segundo ínfimo da nossa Galáxia?
Já imaginaram como tudo é um instante ínfimo, que cabe numa eternidade de olhares e de vidas que se sucedem?
E um segundo do Universo? Um instante ínfimo que nos vive longe e simultaneamente intimo do nosso sentir, do nosso eu?
Ah! Como somos pequenos se não tivermos a ousadia de criarmos o nosso existir, na fantasia de sermos simplesmente poetas, cousa única em cada um de nós!
Sobre que eixo do destino gira o Universo que cabe inteiro, dentro e fora do nosso Eu?
Não sei! São tudo instantes do destempo!
3 de março de 2006
(im)possibilidades
mas,
perdi-me no labirinto das lembranças do eu que se funde nos instantes do tempo-sem-sementes-possíveis…
2 de março de 2006
pinturas rupestres
1 de março de 2006
a viagem...dos dias
mortos!
sepultados no (des)ver das cores que insistem em não se transformarem em flores de jardim selvagem…
os dias passam,
em
i-m-a-g-e-m
que se perdeu na
margem,
entre as asas gigantes de uma papoila,
que voava sem raízes nem sementes,
mas que ia,
( sempre )
c-o-n-t-i-n-u-a-m-e-n-t-e
em
viagem!
28 de fevereiro de 2006
ainda os instantes...ou o que se soma, com eles...
as linhas agarradas ao destino. teias sem cor que desenham angustias mascaradas de sorrisos. sombras…continuamente, sombras-afiadas, gumes-de-alma-ferida.
pesam-me,
os instantes contados ( re-contados e perdidos no nada, extinguidos sem tempos )…
pesa-me,
esta obrigação de os ver todos !
ah! como queria ser distraído e só os olhar (aos instantes) deformados no sonho, moldados na realidade do sentir…
mas,
aqui estou, (novamente, repetidamente) a olhar o vazio que me forja o eu, como se não soubesse já que o horizonte só se vê quando o procuramos!
pesam-me,
estes espinhos-de-petalas-de-rosas-com-perfumes-de-sol, como se a fantasia me mentisse deliberadamente ( em gozo de palhaço a fazer horas extra de espantalho de searas ao vento sul), este falso existir..
ah! porque sou ( apenas ) um somatório de instantes que não sei colorir?
23 de fevereiro de 2006
22 de fevereiro de 2006
jogos
21 de fevereiro de 2006
eles
um
e
outro,
indiferentes à “cópula do sol (*)” com o azul,
cegos no amor
que os devora no escuro…
fronteiras-de-pele que se tocam
no sal
( suor fecundo! )
(*)“cópula do sol”, imagem roubada ao Mestre José Gomes Ferreira in Poesias IV
20 de fevereiro de 2006
apontamentos sobre a morte
( nossa, dos outros ou na memória-de-cada-grão-do-Universo-que-nos-pertenceu-no-Eu )
☼
A morte entrou em monólogo de velas-navegantes com o vento e desenformou-se em algodão-de-nuvens-lilases…(cousa estranha esta, das letras se juntarem na palavra m-o-r-t-e , vezes várias no desfazer dos instantes que me vivem, como se não tivessem imaginação…)
( logo hoje que a solidão adormeceu cansada de tanta agitação!!! )
☼
Curiosa esta nossa mania de guardarmos a morte dentro de uma caixa, como quem se quer iludir, capaz de a esconder-negra, no escuro de uma noite sem tempos…
( ah! Ilusão decrépita! Eu vejo-A claramente a espreitar por todas as flores-coloridas-pelo-sol! )
19 de fevereiro de 2006
história sem titulo, porque as histórias não o têm...
e
mais tarde com tudo). o menino, esse da história, apaixonou-se por flor amarela
e
colheu-a, levou-a entre os lábios a sorver-lhe o sangue, no fim ficou sem saber o que fazer. tinha-a em si, mas perdera-lhe o olhar
e
ficou triste por ter o amarelo entre as mãos. em dia outro voltou a ver a sua flor na terra, amarela outra vez, linda a sorrir-lhe. já não a colheu
e
passou a falar com ela
e
ela passou a estar dentro da sua vida. assim aprendeu a amar.
e
assim passou a amar, flores, arvores, cães gatos, pedras, montanhas e rios…quis fazer o mesmo com as pessoas, mas desconseguiu . as pessoas queriam ser colhidas, queriam ser únicas em cada um. queriam ser posse
e
únicas, como se fosse possível amar
e
ter! para o menino, esse da história, amar era precisamente não ter, era deixar ser
e
ver. era esse o seu caminho. ser autentico
e
intenso para cada coisa que lhe cabia no olhar. intensidade era, para ele a palavra que mais se parecia com o amar. intensidade só se consegue sendo-se inteiro, porque só inteiro se consegue dar!…
17 de fevereiro de 2006
loucuras ( minhas? ou dos ventos?)
e
tatua-os nas nuvens
em sussurros de Chopim
( só ) eu,
lhe vejo os laços, ( sangue-ferrugem )
da árvore-mocho
que me abraça
na noite-nua
em que me enlaço...
insinuações
ocas
perdidas no espaço…
( ah! são cada vez mais loucas,
as palavras que faço!)
15 de fevereiro de 2006
fantasias de quem passa de olhos na calçada
13 de fevereiro de 2006
pintar A flor que nos persegue no sentir
cousa solene,
importante,
quase divina,
( feiticeira? )…
escolhe-se a cor,
o tom,
o odor,
e em traços leves,
suaves
em murmúrio dos ventos,
desenha-se,
( escreve-se? )
na pele-da-alma,
( o voo-das-aves? ),
só depois,
quando o amor,
nos acalma,
aguarelam-se
carícias,
matizes
( melodias?)
e
por fim
( quase um inicio…)
no fundo de mim,
( de ti? )
gravam-se
na terra-escura,
as raízes…
10 de fevereiro de 2006
no desfiar dos instantes
9 de fevereiro de 2006
8 de fevereiro de 2006
7 de fevereiro de 2006
folha-de-mim
UMA,
só…
A que me UNE e esvoaça em folha-morta-de-outono(s)
e
se resume
num (qualquer) eu ( meu)…
Pesa-me a cor,
a
forma,
informe
que se cola ao chão húmido-de-ventos,
varrido-por-caminhos,
espezinhados,
indiferentes ao UM,
que se despedaça de MIM…
Pesa-me uma palavra
só,
Lenta, como os respirares das flores, em noites de sombras-de-estrelas
6 de fevereiro de 2006
a estátua
não é arvore!
sou eu!
inteiro!
pendurado-no-existir!
3 de fevereiro de 2006
cousas do Zé
Depois serenou, cheio de interrogações e vagabundagens entre os eus que o vivem, questionando, um a um, qual deles sofria de inépcia de vida, qual dos eus seria obtuso ao ponto de serem visíveis deformidades cognitivas. Não foi difícil chegar encontrá-lo e foi com um sorriso que o abraçou. Ali estava ele, tímido e escondido, quase envergonhado por quer saber sempre mais que o visto, porque entendia que para de lá de um gesto, de uma palavra, existiam cousas outras, por isso perguntava sempre, insistia sempre, para que o gesto ou a palavra transpirassem toda a mensagem, toda a cor e todo o desenho.
Que os outros percebessem antes do Zé, é cousa que não o incomoda ( sei-o eu que lhe sou intimo), porque o que o dito Zé faz com o que entendeu, ou deixou de entender ( antes ou depois de outros) é coisa só dele…
2 de fevereiro de 2006
sortes
em nuvem-papoila,
que se desenformava em flor-de-pétala-caída,
procurei Nortes,
sentidos,
para esta vida,
morta de venturas,
e
Sortes!
1 de fevereiro de 2006
as cores do sol
e
as nuvens, revoltadas, andam em recuada, a rirem-se divertidas com as cores do frio
31 de janeiro de 2006
beleza pura
30 de janeiro de 2006
paleta de sons
Eu, sou-um-meio-cego-nas-escritas-do-som e apenas me maravilho com o que me entra sem pedir licença, pelo corpo e pelo sentir, mas desde hoje que me ponho a adivinhar melodias quando me perco nos amarelos e nos azuis... ( há que ir com calma e não avançar de atropelos de homem-sedento-perdido-no-deserto, para o arco-iris inteiro).
27 de janeiro de 2006
(a)correntado
Há 10 anos...
1. dez anos é uma eternidade nos labirintos de uma memória desorientada, sei que andava por aí a fingir-me vivo, imergido em 15 horas de trabalho por dia
2. sentia-me mal dentro de mim
3. comecei a revisitar um menino meio perdido que se escondia nas sombras
Há 5 anos...
1. mudei de vida e de prioridades, comecei a sentir o olhar e as cores
2. completei uma colecção de banda desenhada “ O cavaleiro Andante” e senti-me dono de um tesouro
3. descobri a cor de papoila-que-acorda-nas-madrugadas, e passei a usá-la no desenho das palavras, e em TODOS
Há 2 anos...
1. deixei de fumar, de um dia para o outro. zanguei-me ferozmente com os cigarros. ainda hoje não nos falamos
2. comecei a gravar os sonhos num moleskine ( vaidades que sabem bem)
3. perdi de vez a esperança de me dar bem com a minha memória e optei por me deslizar no destempo
Há 1 ano...
1. percebi que sonhar fere mais que uma lâmina afiada
2. decidi voltar a África o mais tardar dentro de três anos
3. reinventei um azul-lágrima que uso sempre que me sinto gaivota
Ontem...
1. reli o primeiro volume de Dias Comuns de José Gomes Ferreira
2. suei para chegar ao fim do dia com um enorme sorriso de satisfação
3. não me lembro de ter adormecido, coisa rara e para relembrar, pois acompanha-me uma insónia crónica que me inquieta as noites
Hoje...
1. zanguei-me com a almofada, tentou mandriar-me, com conselhos desonestos
2. estou com trabalho até à ponta dos cabelos
3. faltei ao prometido a mim mesmo de não voltar a responder a cadeias deste tipo, mas como foi pedido com carinho aqui fica. não vou no entanto endereçá-lo. fica por aqui a pairar…
Amanhã...
1. como dizia o poeta ( José Gomes Ferreira) todos os futuros são patetas, mesmo aqueles que quase nos entram pela janela, como esses que são já amanhã ( isto digo eu , que o não sou…poeta)
2. vou a Lisboa, como se isso fosse importante, mas no meu caso sabe sempre bem olhar raízes
3. só tenho dois pontos para amanhã, os outros cabem todos no maravilhar do imprevisto
Cinco coisas sem as quais não consigo viver:
1. tempo, preciso desesperadamente dele para me sentir senhor dos meus próprios passos
2. do mercado das cores, de cores frescas todos os dias
3. de uma dose diária de solidão
4. de sentir que pertenço a uma família
5. sem horizonte, nem que seja desenhado. Ando sempre com essa linha difusa diante do olhar
Cinco coisas que compraria com 1000 euros:
1. completava a 4ª série do Mundo de Aventuras ( banda desenhada)
2. completava a 3ª série do Mundo de Aventuras ( banda desenhada)
3. já não restava grande coisa
4. já não restava grande coisa
5. já não restava grande coisa
Cinco maus hábitos que tenho:
1. não tenho hábitos, detesto rotinas, atropelo todas as rotinas …tenho o hábito de atropelar rotinas…
2. ( mas defeitos tenho muitos…..ehehehehe)
3.
4.
5.
Três coisas que me metem medo:
1. confesso que é coisa que aprendi a não ter, a partir do momento que me desinteressei de pensar na Morte
2. respeito o MAR
3. e o Ar, quando me voo
Três coisas que tenho vestidas:
1. gravata azul escura
2. camisa azul clara
3. calça azul escura
Três coisas que quero mesmo muito neste instante:
1. acabar esta coisa
2. iniciar a reunião que me espera
3. beber um café
Três lugares que gostava de visitar:
1. nuveares.
2. ano 33 dc
3. a nau perdida que acostou terras de santa cruz antes de 1500…
26 de janeiro de 2006
abismos, quase breves...leves
25 de janeiro de 2006
construções

( fotografia de Patricia Sucena de Almeida)
construo-me com olhares, são eles os meus tijolos, "umporum", alinhados em labirintos d'horizonte...
( o horizonte é a minha verticalidade. é o meu pedaço de sonho que me tece e enlaça no céu e na terra, num cruzamento de um ponto de partida , para um mergulho no Universo)
24 de janeiro de 2006
futuro(s)
In " Apontamentos para um manual da serenidade " ( ou como nunca devemos transformar o amanhã no hoje, para não perdermos o espanto de nos maravilharmos com os instantes do absurdo que nos reservam os futuros)
23 de janeiro de 2006
sem margens
só olhares para diante,
como um naufragado,
abraçado pelo horizonte...
20 de janeiro de 2006
entulho(s)
entulho-do-tempo,
folha-de-outono-de-lugar-incerto
pó-de-sol,
nuvem-seca,
vagabundo-do-deserto,
varrido para um canto
como cinzas-de-mar,
cansadas do desencanto,
de já não sentir o sonhar…
sou,
grão-de-saudade,
pólen-de-onda,
que já não sabe ser,
que perdeu a vaidade,
de se maravilhar,
com um simples olhar,
de-menino-em-liberdade…
sou,
eterno-caminhante
árvore-sem-idade
sem raizes
para navegar…
19 de janeiro de 2006
paleta, sem cor-de-guitarra
dia-todo,
melodia de guitarra que penetrou na alma, como quem se esconde-do-mundo…(não deve existir poesia mais suave do que aquela que se sente sem letras nem palavras e se entranha em respirares, num sonho que nos acalma e nos acorda em alentos ternos, como afagos de amor que se desenham lentos em passeares de mão-de-mãe-sobre-a-cabeça-de-filho-enroscado-em-regaço, protegido)
respirei
dia-todo,
melodia de guitarra que me abraçou em versos que não sei…
parecia sussurros de papoilas-entre-searas-ao-vento em quadro que não pintei ( isto de não ter cor de guitarra é cousa que não se perdoa a ninguém…)
18 de janeiro de 2006
querer ser, e crer
ser
mais que eu-próprio
mas,
ser-me,
escondido-por-inteiro,
nos olhos de menino
que sonha,
ser
cavalo-marinho, abraçado em ondas-de-azul-horizonte,
desenhado,
sem papel
ou
pergaminho,
fabricado,
não
em pele
ou
papiro,
mas em lágrimas de fada-sininho,
e
sedas,
em cor-de-sol-quando-se-deita-baixinho…
17 de janeiro de 2006
ainda as dúvidas...
muitas,
pergunto-me o que escondo por-de-trás-do-eu, que me ensombra o existir e me aparta os passos…
pergunto ao reflexo incolor do sentir por onde vou na escuridão do ir e do agir…
sei que cada qual tem uma só sombra (por dia) e que é o eu-de-cada-um que a move,
mas,
o
que me pergunto, é se ( no meu dia e no meu caso) é a sombra que me empurra os passos, ou se são estes que a transportam…
13 de janeiro de 2006
sementeira(s)
Vejo ( em esvoaços bailarinos, no interior da minha fantasia) a cor de cada uma das sementes…cousa-de-maravilhares, que não sei se direi…( torno-me animal-egoista, fobágico-de-mim, quando-me-escondo-no-olhar-transformado-em-sementeiro-de-borboletas-coloridas).
Fica no entanto, escrito, para que possas Tu, que lês o desenho, inventares a tua própria colheita ( seja ela de borboletas, pirilampos, pétalas de papoila, foguetes-de-encantar, flocos-de-neve-azuis-de-mar, ou cousas outras que esvoacem dentro de ti…não é difícil…basta sonhar…o desenho, esse aparece num instante, no ar…)
12 de janeiro de 2006
o peso exacto de um sonho
media o peso preciso de um azul-mar-em hora-de-gaivota-pousar-no-sol… media o peso exacto da gaivota que ao pousar no sol, o esconde para de lá do dia!
11 de janeiro de 2006
no olhar de um alguém
( fotografia de Patrícia Sucena Almeida )
Encontrei um anjo-sem-asas, ( pedra esculpida, branca,,,alada) a sorrir cheio de respostas e de olhares…
“porque te sorris, de vontade-colorida, se perdeste o voar?”, pergunto pintado-de-curiosidades-no-limite-do-espanto…
“porque aprendi a dar passos e a sentir o chão-do-meu-caminho! Sorrio,,, porque mergulho na descoberta, e nela, envolvo-me em liberdade!”
…ou como a Liberdade ( ou emoção qualquer) está em cada qual e depende do olhar de cada um…
In” apontamentos para um manual de um pintor que procura coisas outras para desenhar, a alma da cor , ou em alternativa a sua própria serenidade”
10 de janeiro de 2006
o túnel...( ou a estrela? ou cousa outra só minha?)
9 de janeiro de 2006
Há tanto tempo, que o sinto hoje
Dia houve que não se conteve no grito e pintou um corvo. Negro-de-bico-amarelo.
E
todos se puseram a olhar o corvo e a tentar ver, naquela coisa escura-alada, uma flor.
Mas,
o que o menino tinha nos olhos era um corvo-negro-de-bico-amarelo, negro-da-cor-de-um-grito, muito longe se ser uma flor, que flor não grita, perfuma-se de cores-outras…
E
no entanto quer a flor, ou o corvo andaram lado a lado no existir dos olhos que os desenharam, mas cada qual com o seu nome ,
E
não fora, por o menino pintar um corvo, que o incomodava no grito, que desaprendera de pintar flores, mas o seu caminho, agora, provavelmente era outro…
o primeiro, poema
gritei-O, de olhos estendidos para o diante...como quem expulsa a liberdade que não cabe dentro de si...
5 de janeiro de 2006
Procurei um lugar...
Procurei de passos lentos na cidade grande, um lugar. Procurei raízes, minhas para me libertar das letras e da humanidade. Fui de sentido, nos passos que me dei, ao Miradouro de S. Pedro de Alcântara. Queria horizonte pintado de telhados,
de cidade,
de casas,
porque debaixo de cada um dos telhados vermelhos, vivem pedaços da humanidade, e é ela que me incomoda, que me pesa nas palavras.
Fui de passos meus, mas estava em obras. O lugar, O jardim, O horizonte, É natural. Tudo está em obras. Até a humanidade, é obra-fechada-ausente-de-olhares.
Desci a rua da Trindade, ainda por entre raízes, minhas, à procura de horizontes. Espreitei o Tejo, mas acabei os passos na Brasileira. Sinto-me bem junto de poetas-fantasma, sobretudo quando sinto todo o peso da humanidade nas letras que se soltam quase-rio.
O sol está frio. Ainda bem. Preciso de frio, não vá o senti transmutar-se em lágrima, ou grito. Assim, finjo-me fantasma, forma neutra de estar na vida. Um quase-não-estar, é como estou hoje. Estou preenchido com-um-não-estar-inteiro-no-eu.
Quero escrever…sobre África.
Não sei razão porque evoco sempre Africa quando sinto a humanidade inteira na minha indignação.
Procuro as palavras, como garimpeiro.
Procuro as palavras que se embrulham em grasnares-de-aflição, em rugidos surdos, em turbilhão .
(estou rodeado de estranhos que se falam todas as línguas, menos a de Pessoa, mas é ele que os junta. Isto nada tem a ver com o sentido do escrito, só com o local. São palavras outras que soam entre sabores de café. São no fundo intervalos do sentir. Palavras que se escapam, para me iludir…)
Procuro palavras. Uma só palavra. Uma palavra-rolha que solte tudo o que me pesa…
Olho à volta…vejo pombas ( pombas da cidade, são coisa outra. Também elas perderam o horizonte) e olhos. Muitos ( uns e outros, esvoaçam em passos, no chão…sem voares, deve ser do peso…da humanidade em cada uma delas).
Distraio-me. Olho mulher de meia-idade que me fixa a escrita. Tem olhos de mar e cabelo-névoa. Acaricia um livro-fechado.
Afinal não me fixa.
Está ausente.vagabunda-de-aventuras, ou, como eu, na meia-idade, procura palavras. dela…
O dia está frio. ainda bem.
Volto a África e vez outra me perco. Não consigo pensar em País algum quando me encontro com África. Visualizo um continente inteiro.
Um só.
Talvez por ser berço do Homem. Por isso quando A penso, quando A olho com o sentir, junto-me a toda a humanidade.
Quero falar de solidariedade. É esse o meu grito.
Quero falar de imagens. Das imagens que nos entram casa-dentro e que nos comovem…lembro o tsunami a entrar todo ele na sala quente, de um Natal outro. Lembro imagens atrás de imagens, dias após dia. Lembro a humanidade inteira a mobilizar-se para ajudar, naqueles dias, os dias das imagens. Lembro o Ocidente incomodado pelas suas mortes no Oriente. Relatos e mais relatos…todos com os olhos para diante, em lágrimas. Depois destas, vieram outras imagens. Estas foram, como vieram. Outras entraram, de França, de uma França em tumulto, de uma humanidade de subúrbios em alarme.
Anos após ano inundam-nos lágrimas de imagens.
Consumimos imagens, consumimos sentires, guardamos gritos, guardamos lágrimas. Reagimos e (des) agimos ao sabor das imagens que nos marionetam a solidariedade.
Só existe o instante de cada imagem, doseada a contento e dirigida a contento, instantes após instante. Depois tudo se esquece, se apaga, como se o Mundo se estagnasse, se suspendesse. À espera das próximas imagens.
Lembro, Terramoto no Irão, Furacão Katrina, e tantas outras catástrofes que nos mobilizaram o sentir e os actos solidários. Em lentidão de consciência, agimos, com lágrimas, (des) agimos nos gestos , quais marionetas de teatro ao som de imagens, ao som de placas que nos induzem o sentir;
“CHOREM!” e choramos!
“Riam!” e rimos!
“Aplaudir agora!” e aplaudimos, frenéticos do existir…
Está frio! Ainda bem.
O sol está frio, como eu, como as pessoas que me passam ao lado, esquecidas do Natal, do Katrina, das imagens…
E as outras imagens?
As que não vimos?
As que já vimos e já não mostram?
Onde se esconde esse sentir?
Esse agir?
A fome continua ali no Uganda, no Senegal, em Moçambique, nos pingos de África que já não choram.
Ela ali está! Fria! Presente! Os dias todos, dias após dia. Mas os meninos que choram são todos iguais, tão iguais que se confundem nas imagens. Imagens iguais cansam, não se vêem, Não nos solidarizam!
Somos mais facilmente tocados por uma catástrofe natural do que por aquela que nós próprios provocamos, com os nossos actos e com a nossa indiferença…
Não sei em que sociedade vivo!
Não sei que sociedade crio!
Não sei em que sociedade me existo!
Sou,
eu,
também mais um que se comove com as imagens, mas que me deito e me durmo, como tudo se passasse nas imagens de um teatro humano.
Hoje grito no meu silêncio, porque também eu, carrego hoje, todo o peso da humanidade, como se não lhe pertencesse na DOR!
Está frio! Ainda bem! Não fora o Tejo que se esconde ao fundo ( e que não me é imagem agora) e diria que nele correm todas as minhas lágrimas que se engasgaram neste frio-de-inverno-de-uma-humanidade-que-já-não-grita!
Procuro palavras. Não sei palavras. Muito menos poesia! Apenas oiço em ecos a voz do poeta-inconformado ( fantasma ou não)…
Eu, apenas escrevo mais uma página, deste meu diário, deste meu sentir partilhado, que rasgo de mim e o esvoaço ....
É PRECISO AVISAR TODA A GENTE
DAR NOTICIA, INFORMAR, PREVENIR
QUE POR CADA FLOR ESTRANGULADA
HÁ MILHÕES DE SEMENTES A FLORIR.

É PRECISO AVISAR TODA A GENTE
SEGREGAR A PALAVRA E A SENHA
ENGROSSAR A VERDADE CORRENTE
DE UMA FORÇA QUE NADA DETENHA

É PRECISO AVISAR TODA A GENTE
QUE HÁ FOGO NO MEIO DA FLORESTA
E QUE OS MORTOS APONTAM EM FRENTE
O CAMINHO DA ESPERANÇA QUE RESTA

É PRECISO AVISAR TODA A GENTE
TRANSMITINDO ESTE MORSE DE DORES
É PRECISO, IMPERIOSO E URGENTE
MAIS FLORES, MAIS FLORES, MAIS FLORES.

( poema de João Apolinário e fotografias de Sebastião Salgado)
Nota: agradeço a Manuel Garrinhas e à Manuela que me relembraram poema que quase-tinha-esquecido
no deserto do ver
onde,
pêndulo-o-olhar
quedo-me,
inquieto,
em
q
u
e
d
a
que vivo
em
balão-de-menino,
colorido
e
dou
nome-ás-estrelas,
num
voo-de-águia
em
cores-de magnólia
velado
em
areias-tuaregues
onde,
navego
perdido
4 de janeiro de 2006
tatuagem
e
deixei que o vento me tocasse a alma,
em tatuagem,
selvagem de mim
2 de janeiro de 2006
vestir o dia
vermelho-sangue,
de
outono…
pousou-morta ( a folha? a dor? ),
em silêncio,
sem lágrima…
só,
ali,
no chão,
perto-de-mim…
vesti-me da sua cor,
e
caí…
papagaios-de-papel
em
nuvens-de-olhar
qual,
papagaio-de-papel,
abraçado-no-sonhar,
voam,
suaves…
cada-qual,
pétalas-de-papoila
a planar…
um,
é borboleta,
outro,
qualquer-letra
mas
aquele ali,
que se esconde no alto,
quase-nuvem,
quase-onda
sou eu,
inteiro
a-navegar…
1 de janeiro de 2006
o vitral
na água...
nem azul, nem verde,
um vitral,
com deuses
e
meninos,
a brincar
com o sol
que se gotinhava,
no rio
em cores de brilhar…
desenhei um vitral,
nas lágrimas
sem sal
no frio.
tinha, ( o desenho)
um homem
pequenino
( não fora ele,
menino…)
a rezar,
sozinho…
( os deuses,
esses,
estavam no vitral
a ouvir,
o menino),
e
o rio,
ia,
corria,
sem saber do vitral
que arrastava
desenhado na pele
com as cores do natal.
não!
os deuses não se enganaram,
nem se distraíram,
nem o rio,
eu,
é que desenhei
o que sentia,
encantado,
com o que via…
30 de dezembro de 2005
19 de dezembro de 2005
16 de dezembro de 2005
quando o Um se perde ( ou confunde) numa única parcela
apontamentos para um manual da serenidade
15 de dezembro de 2005
ao som de uma guitarra
14 de dezembro de 2005
simultaneidades
eu, ( deixem-me ser assim, na solidão do eu-mesmo, todo lá dentro, no interior do volátil e do vento que me habita) , quando me acontecer o Não-Ver ( ficaria talvez melhor o Não-Ser, mas esse não me existe, nem no ainda nem no depois) e for um grão de terra, vou ser pétala-de-papoila-e-sorri-me-de-cor… e serei um grão de terra que não cabe no universo, porque simplesmente é sonho, meu…
13 de dezembro de 2005
não há caminhos rectos, nem na luz...
12 de dezembro de 2005
artífice de “nuveares”
insisto. insisto-me.
sem abismo. (só o há, na angustia…)
no foco, é apenas altura. espaço de voares…
barro-lhe o caminho. em barro. oleiro de nuvens…
a planura deserta-me. só o olhar me foge. me finge. lugares…
gosto do longe. do re-desenho. do começar. do ser…
insisto. insisto-me. sem sombras. com luares…
adormeço-me. nos passos. no reflexo.
nas cores-guardadas-da-noite.
de ventos que sopram
em divagares…
9 de dezembro de 2005
ilusão
8 de dezembro de 2005
disse-me
Apontamentos para um manual da serenidade
7 de dezembro de 2005
6 de dezembro de 2005
incompletude(s)
5 de dezembro de 2005
2 de dezembro de 2005
o ponto
1 de dezembro de 2005
nos teus...caminhos, ao Sol
30 de novembro de 2005
mocho-cego
e
as palavras. aqui.
e
eu sem mim.
29 de novembro de 2005
o desenho de uma árvore
28 de novembro de 2005
incongruências sem metafísica
O desenho é uma linha incompleta, mesmo que contenha todas as cores do Universo.
Por isso o Sentir é muito maior que todos os nossos universos, não cabe no desenho, nem na cor.
Nasce sem Semente!
Nem Metafísica!
Mas existe-Nos inteiro no Corpo!
25 de novembro de 2005
quando cada um é UM escondido na multidão
da cidade!
Muitas…
Iguais…
Sem nome…
Todas!
No entanto, quando uma voa,
só,
leva o olhar
e
os verdes
e
os azuis,
e
as poesias,
Todas!
Por colorir,
e
o nome,
inteiro,
s-o-l-e-t-r-a-d-o com o existir...
24 de novembro de 2005
outono(s)
preso,
agrilhoado numa flor,
23 de novembro de 2005
brincares
“ brinca comigo”…
peguei-o,
atei-lhe cordel
e
lancei-o ,
qual papagaio de papel…
quando,
lá,
no ir,
já,
no alto,
lá
no cimo,
e
ainda a subir,
soltei-o,
mais além
e
vi-o
a desfazer-se no céu azul a fugir-se,
a fingir-se voo de pássaro-nuvem...
22 de novembro de 2005
reflexos
que não escrevo,
que não sei…
mas,
quando
se
formam
l
á
g
r
i
m
a
s,
esculpidas em queda-de-mil-cores,
escrevo,
o que não vivi
na
história escondida no reflexo-do-sonho
que
andou perdida dentro de mim…
21 de novembro de 2005
tempo(s)
quantos acasos?
poucos?
nadas?
uma Flor não se pinta num único instante, tem todo o peso do Universo,
e
o Tempo Dele , é magia que não desenho!
17 de novembro de 2005
resistir
sem sentir
em revolta surda,
amordaçada…
resisto
cansado
das palavras que se transformam
em reflexos que não pintei...
resisto
de ser palavras
que não sei…
mas,
não desisto
de ser palavra alada
porque só me sei vento
que abraça sentimento…
16 de novembro de 2005
15 de novembro de 2005
sem espaço
dança um verso,
sem poema,
habitáculo-do-sonho…
castelos-no-ar…
grito-de-borboleta-em-olhos-de-menino…
flor-em-desenho-insano…
gira-sol-do-mar…
voo-de-homem-pássaro-sem-destino,
coisas outras,
tantas
que sinto…
fosse eu mais minúsculo ainda
e não me cabia…
mas não importa
porque importaria?
se a flor não cabe na terra…
se o sonho não cabe em mim…
ah…ser ínfimo assim
e
quase ser universo,
é ser gota de sal
num mar sem fim…
14 de novembro de 2005
cair na planura
e des-nasci-Me num imenso azul,
tal águia-solitária
leve
na
Solidão-da-planura
e
deslizei
no
Sentir…
no
Apenas…
no
Existir…
12 de novembro de 2005
cegueira de um eu que não fugiu
nem sentir,
enquanto fores só,
assim,
animal selvagem,
dentro de mim…
10 de novembro de 2005
searas
outra,
mais ali,
outra ainda,
quase além…
vou demorar-me no tempo
como quem espera um nada…
serão árvores?
flores?
cores?
sentires?
conjugações do Amar?
vou ficar, não vá uma delas crescer longe do meu olhar…
9 de novembro de 2005
finjo-Me, a mim...de SER!
vezes há, que nos extinguimos na solidão de uma bruma espessa…
Só oiço o mar, que me chama,
sem chama,
na ilusão do estar aqui…
Desenho um círculo com um tamanho,
só,
sem dimensão…
Estou , numa ausência irritante de me querer num Eu que já não sou…
e
finjo,
finjo-me,
cores como quem dissimula vida nesta noite-quase-escura, que me tolda a visão,
e
finjo
finjo-me,
passos,
caminhos,
empurrado pelo querer de ser onda,
de ser pássaro
e
vivo-Me no delírio de SER!
8 de novembro de 2005
noite de bruma
com a intensidade suave,
de um beijo,
voado no vento…
beijo-ilha,
navegante…
escrevo
a
noite, ( neste barco sem quilha... )
em desenho-lua,
minguante,
reflexo de onda,
do teu mar
cintilante…
barco de silhueta-nua,
poema sem letra,
nem musica,
nesta noite-escura,
intrigante…
beijo-sopro
que voa à vela,
na névoa,
na bruma,
neste barco-feiticeiro,
nesta Falua,
que bolina num Tejo,
fantasma
que já não vejo
neste teu beijo
que desceu à rua ...
7 de novembro de 2005
esculpir, em cores várias...um quadro, quase sem letras
nota1: texto curto, é verdade, mas deve ler-se com fundo azul. Claro no cimo (quase dia) , escuro no baixo ( quase noite); a árvore, um imbondeiro-sem-tempo ( como a África-Inteira); as borboletas…muitas, com cores de tamanhos vários; as raízes…TODAS!...cor de sangue, a pingar gotas de terra ...
nota 2: permite-se variantes para o fundo…cor-de-fogo-no-fim-de-tarde-dos-trópicos, e leituras outras, mas essas já não me pertencem, mas maravilham-me na mesma…
6 de novembro de 2005
partir, à procura...
não olhar qualquer, esse tem palavras gastas, usadas, desusadas, mas os olhares-do-antes-da-lágrima...
ah! esse, deus-meu, é palavra que ainda não sei!
4 de novembro de 2005
corridas
3 de novembro de 2005
2 de novembro de 2005
dimensões do Ver
Não, meu filho, não te vou emprestar o meu olhar, se o fizer, morro no teu Ver…
Está bem papá, mas olha, vou-te desenhar assim tal qual,
Grande!
Gigante!
Vou desenhar-te, na imaginação, sem papel, só assim cabes inteiro no meu olhar…
1 de novembro de 2005
misturas
31 de outubro de 2005
o nosso nome
e
cores que nos trazem outros, como se o nome fosse a nossa História.
Não queria entrar em equívocos com as histórias sem rosto nem voz.
Não é o meu gosto, mas a nossa história ainda não existe no nosso nome!
Eu,
ando sempre sem nome-concluído, porque o meu nome transmuta-se no olhar de cada um…
Divirto-me com todas as histórias que escrevem no meu nome, tão diferentes são do meu sentir…
Eu sou,
todos os nomes que me inventam, mesmo que sejam história de mentir…
Por isso,
querem todos, saber sempre o nosso nome, para nos criarem um existir…
E nós,
por mais que desenhemos a nossa própria sombra, somos sempre nós, mais todos aqueles que se pintaram no nosso nome porque passamos a existir disformes em cada um que se esquece de olhar a alma que dá caminho à nossa própria história…
In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como devemos saber coexistir com todos os eus que nos inventam, com a certeza de sermos sempre só um, e que a imagem que nos desenham no nome , é apenas isso, um desenho da imagem…
28 de outubro de 2005
perseguições
em forma de asa,
quase anjo.
mergulha-me afectos escondidos num búzio ,
sopra-me sonhos,
esperanças,
e
deixo-me inundar nas ondas,
nas asas,
brancas
e
sinto,
o pedaço ínfimo do universo
que sou,
gota de um nada
que vê
onde não estou...
sigo-o
vou,
(sede vital,
esta coisa de ir),
sempre,
em continuo
em fragmento,
em número,
zero ou um
(ah! só há dois números no universo,
e só um se soma,
todos tem verso
e reverso
mas só eu não me encontro em nenhum,
perdido no espelho)…
sou o desenho,
de gaivota
que plana,
azul,
que sente o instante de ser,
apenas,
ponto sem distancia,
sem corpo,
nem luz ou chama...
(ah! ser simplesmente o acaso,
ser intersecção do destino,
e ser assim inteiro,
ar
vento
poema
vida,
é mais que desenho
é coisa quase nada,
quase tudo,
paraíso
que
canta,
e embala
como os olhos de menino
que desenha uma flor,
uma estrela,
com as cores de um sorriso),
persegue-me um som de mar em sons de violino...
27 de outubro de 2005
as outras cores
É azul a minha flor? É não é, papá? Diz-me! Diz-me! Gosto tanto dela assim, azul…
Para ti será sempre, a tua flor-azul, foi assim que ela te nasceu no olhar…
Cada um de nós tem o seu olhar, o seu reflexo, a sua cor, para cada uma das coisas que abraçam o Ver…
Que bom papá! Assim tenho sempre coisas novas para aprender…Diz-me papá, diz-me, como é a cor da tua flor?
26 de outubro de 2005
mutações
sinto-o!
em raízes,
fundas,
de terra,
como quem agarra a queda,
de mãos fechadas,
apertadas…
ah…fosse eu apenas folha-de-árvore,
não ficava,
largava tudo
e
era nada…
25 de outubro de 2005
encontros
O corpo está,
Vazio.
Vejo-me apenas,
Ao fundo…
Estou no caminho, entre os olhos e a alma,
A descansar os sentidos,
Estou,
Entre o aqui e o além...
24 de outubro de 2005
(des) orientações
Finge-se em transparências e na ilusão de ir com o vento…
Só a vela vai,
no diante,
Mas,
só o leme sabe o que sente a alma do navegante…
In “apontamentos para um manual da serenidade” ou como para além do vento, para além do caminho, o importante é o querer…
21 de outubro de 2005
feitiços-da-terra ( desenhos-da-terra)
o desenho-da-terra,
sulcos,
soluços-de-cor, que me embaraçam, o ver,
no bailado do sol,
a renascer…
Risco,
o riso-sorriso-da-terra,
que me afaga em ondas de mar,
e
pinto, de asa-flor,
com olhos de amar,
uma tela,
em tons meus,
de aguarela,
castanha, vermelha, verde, lilás,
Amarela…
Risco,
pós-de-cor,
de giz,
cinzelado-ao-vento,
o poema que diz,
lento,
a forma que fiz,
do rio que passa,
a dançar feliz
nos cabelos-mouros de uma cigana,
enlaçados,
em flores-de-liz,
quase linda,
quase bela…
Risco,
a-cor-da-terra-que-me-leva
e
lava,
enfeitiçado,
no barco que me navega,
ao som do mar,
ao som da vela,
neste dia que me foge,
em sonho,
singelo,
alado…
19 de outubro de 2005
conversares
e
o que sobra são cinzentos fingidos de sombra.
Todos os dias têm cores e sentires, escusas de insistir com essa tua tristeza, foge do poema que te arrasta na melancolia, deixa que as cores se aguarelem no caminho!
Não vês tu que elas estão lá?
Esperam-te!
Não as vês tu, a dançar?
Pobre de ti se te mascaras no tu que te foge do eu…
Deixa A poesia,
e
embebeda-te do dia.
Não A escrevas,
não A sintas,
não A pintes.
VIVE-A!
Ama-A !
Ai!
Quando o Ulmeiro me abraça e se põe a sussurrar,
não sei o que faço,
não sei que diga,
entrelaço-me,
adormeço
e
esqueço
o
Eu,
que não acorda
e
me fadiga…
18 de outubro de 2005
no caminho que faço
o
passo que passo,
piso-o,
risco-o,
descalço,
como quem escreve,
febril,
e
bebe água que ferve...
Marco-o,
passo a passo,
como quem cinzela na pedra,
corpo de mulher,
ou
flor de Abril…
Sangro-o,
de passo em passo,
como rio que nasce,
e
morre nuvem,
longe do mar...
Sinto-o
no tempo que tomba,
como quem amassa o pão
como quem vai,
e
não para,
nem que caia
no chão…
Sinto, passo a passo os passos que passo no chão…
17 de outubro de 2005
outonos
Sentei-me apenas para O sentir e deixar que o tempo se extinguisse num nada e se transformasse em quietude.
Silenciámos segredos na cumplicidade da nossa fantasia, embalados nas folhas que se coloriam de Outonos…
O dia desbarulhou-se , só para não nos incomodar e ali ficamos a fingir-nos vivos em transparências de vento, até ao regresso do tempo…
13 de outubro de 2005
estar
No eu!
No qual?
No teu!
In “apontamentos para um manual da serenidade” ou como o amor pode ser uma simbiose que nos equilibra o sentir e o existir, sem que se perca o olhar…
12 de outubro de 2005
intensidade
a angústia de não-me-ser-inteiro-no-Eu, (como a calçada da minha cidade que se desenha nas sombras, entre os brancos-e-negros que lhe existem no Ser…)
Dói-me,
o sentir…
São dores do re-nascer…
11 de outubro de 2005
no desenho da calçada...
Procuro respirares e com eles o sentir da cor e do ir…
Sento-me,
onde os poetas sofreram, onde poetizaram a dor do existir e deixo-me abraçar, envolver, como quem pousa o cansaço no regaço de mãe.
Fico, entre a chuva e o vento…
Ah,
quando morrer quero ir com este vento e renascer na cor do rio-mar que me olha o horizonte.
Ah,
como queria, com desejo quase animal, ser o vento que leva a vela da nau, a bolinar…a bolinar no céu…
Passeio-me nesta cidade, onde a luz reinventa os cinzentos e as sombras em azuis, nas calçadas…
Sento-me,
onde os poetas choraram e deixo-me diluir na chuva que procura o mar e o fecunda…
10 de outubro de 2005
sou
as lágrimas que verti,
olho-as ao vento,
disformes,
brancas,
negras,
e
procuro atento,
pedaços de mim.
Sou,
arqueólogo,
sem história,
que anda sem rumo, por ali.
Sou,
lágrima esculpida ,
azul,
verde,
carmim…
Ah, velas sem navio,
mar sem fim,
deixem-me ser nuvem,
palhaço-criança,
jardim...
Procuro no céu,
a ave migrante
que fugiu de mim...
Sou,
flamingo azul,
que anda por aí,
perdido,
réu,
navegante...
Ah,
Sou,
poema sem véu,
peregrino sem (a)deus,
pintor sem tela,
sem Tempo,
Livro
esquecido,
evaporado,
queimado-vivo…
Sou,
sem chama,
neste mundo,
letra só,
sem sentido!
7 de outubro de 2005
as mãos
Fecho as mãos como quem fecha os olhos, mas o universo escorrega entre os dedos que rezam…
Só o olhar sabe guardar o Universo, vendo-O…
In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como para sentirmos devemos sobretudo, estar de fora
6 de outubro de 2005
dar passos
In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como mais vale caminhar com o sentir do que desenhar passos de sombras que nos invadem o Eu...
5 de outubro de 2005
cores
As cores todas do arco-íris , são de um castanho febril…
Os gira-sois,
As rosas,
As violetas,
O alecrim
As papoilas,
Os narcisos,
As dálias,
O jasmim...
Ah e as outras,
Sobretudo as outras que nascem flor…
Trituram os sais da terra,
E vestem-se da sua cor…
4 de outubro de 2005
astrolábio(s)
Queimo os passos, no mergulho que dou, nos acasos da vida, guiado pelos astrolábios do sentir…
Acendo o olhar , qual fósforo do existir…
E
Vou…
3 de outubro de 2005
sede
Sôfrego de cor,
No calor-do-não-estar-aqui…
Bebi-o!
Todo,
para respirar
e
perder-me no olhar,
sem dor,
por ali…
30 de setembro de 2005
versões
Papá, papá diz-me quantos anos tem um poema?
Um poema? Não sei…depende de quem o escreveu, ou quando…
Que pena papá, queria tanto saber quantos anos tem um poema…Deve ser infinitos, não deve papá?
Infinitos? Porquê?
Porque as letras, papá, têm tantos anos…
Versão do sentir (2)
Os filósofos, os poetas ou as crianças tem destas cousas fúteis de se perderem no pensar, nas sobras da vida, e de se porem a contar a idade que um poema tem…
Têm tantos anos as letras, que não chegam a saber quantos anos tem uma folha de poemas….
29 de setembro de 2005
ventos
e
segreda,
nas florestas sem luz,
palavras desabridas,
feridas,
cegas,
vindas do nada,
sangradas,
perdidas…
Há um vento que dança
desfolhando,
palavras roucas
desavindas,
esquartejadas
pela lança,
de um grito de criança…
Há um vento que esmorece…
que morre
sem esperança
28 de setembro de 2005
paragens
Caído,
inanimado nos desequilíbrios…
Só o menino chorou,
e
esculpida no chão,
nasceu uma gota-árvore,
adormecida,
com um menino
de corda pendida da mão…
27 de setembro de 2005
resistências...
sem resistir…
Dissolvo-me,
nuvem,
no Sol-poente,
doente…
Sou,
pedaço de vento,
demente…
Espero,
sem resistir,
entrelaçado nas raízes,
e volto do nada,
semente...
26 de setembro de 2005
pedra angular
Angular!
Tem cor violeta,
quase azul…
Foi a cor que me voo no olhar,
podia ser outra, mas a vida,
é
roleta,
sem números par…
Esta pedra,
minha
e
tua
é
assim,
violeta,
quase azul,
como as asas de um colibri
ou
borboleta,
desenhadas ao luar…
23 de setembro de 2005
preencher vazios
In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como na vida, devemos, sempre que possível, preenchê-la de sentires, não vá o vazio, fazer-nos escorregar na vulgaridade do existir
22 de setembro de 2005
longitudes...
Longe é quando se pára!
In “ Apontamentos para um manual da serenidade”, ou como, devemos ter cuidados muitos e não tropeçar no Perto, quando nos distraímos ao retirar o olhar do Horizonte e nos perdemos na vontade do ir…
21 de setembro de 2005
melodia das árvores, em tons de outonos
20 de setembro de 2005
Brinquedos
divertido…
Entre as ondas-do-tempo , há, escuso, um espaço de fantasia. É aí que mergulho e quase-quase, bebo alegria…
Nesse, instante-mágico-de-destempo-do-dia, vivo o sonho, de sentir o que está fora-de-mim…
É assim que brinco, com o tempo que me sobra em cada instante de sombra que transborda do meu dia
19 de setembro de 2005
dunas
difusa nas dunas,
de estrelas-navegantes
que se vestem,
com gotas de chuva…
Nem sempre se vê
ou
sente,
anda por aí pintada
nas íris-das-nuvens
a desenhar girassóis-papoila,
nos jardins
e
em cousas outras,
sem formas
nem fim…
Tenho uma alma que bolina, que anda por aí sem mim…
17 de setembro de 2005
desenho de um sorriso em Ré Maior
Percorre-me os dedos,
e
navega-me na pele
solta,
inquieta,
atrevida,
como um pássaro,
que se esconde na cor de uma flor…
Toca,
fado-negro,
em cinzentos azulados,
sentimentos,
rimados,
amados,
sem saudade,
sem lágrimas,
sem choro…
Sou bandeira sem mastro,
nem maestro,
ao vento…
Só a guitarra me ouve
e
fala,
em cada folha-que-me-liberta,
deste ulmeiro sem história…
Sou pássaro?
Sou corvo?
Que importa!
Voo-ausente, nesta melodia,
que bebe o sangue,
do homem-novo,
que renasce,
dia a dia…
Ah!
Fosse eu,
o que o olhar-me-sente,
e
a guitarra que se solta,
e se
desamarra,
quente,
nos dedos,
não era pássaro!
Nem colibri!
Nem rosa!
Nem gaivota!
Nem Arlequim!
Nem lembrança!
Era melodia sem fim,
a cantar por esse mundo fora,
desenhada num sorriso de criança,
que ri,
ao som da guitarra que chora…
16 de setembro de 2005
pinturas
desenhei o céu,
de uma cor só,
em aguarela viva,
dançarina-sem-tempo,
esquiva,
quase flor…
Não oiço o eco,
Não oiço nada…
Tenho a alma,
inteira,
esbatida na cor..
Só o girassol me foge,
em amarelos,
doces,
de-papoila-triste…
Não oiço o tambor,
não oiço nada,
Só a guitarra canta,
o poema que sentiste,
as letras que não escreveste…
Desenhei o céu,
de uma cor,
só...
Hoje…
Não oiço o vento,
Não oiço nada…
Tenho na minha mão,
entrançado,
o coração,
em laços,
em nó,
que chora baixinho,
por ver o céu,
de uma cor só…
15 de setembro de 2005
na dor, de querer SER
ferida,
gotejada em âmbares derretidos em noites cinza,
sem luar,
Guardo os gritos numa lágrima…
Uma,
só,
e
repinto-a gaivota com colar de horizonte,
Olho-a ao longe,
e
abraço
saltimbanco-palhaço
que alivia,
no grito,
a saudade,
de sentir a terra viva
sem dor,
a voar liberdade...
14 de setembro de 2005
memórias desenhadas sem tinta
memórias
e
perdi-me,
no tempo,
na incerteza difusa,
de me ser,
inteiro
na
aguarela que pintei,
confusa,
antes do sonho…
há um homem dolorido,
escondido,
nas páginas do meu livro,
que se veste,
colorido,
aprisionado no destino
e
não voo…
Sonhei,
histórias,
letra
a
letra,
como chuva
desenhada num tempo
que não passou…
agrilhoado
sem esperanças,
em cada passo
que se assustou…
Sonhei,
lembranças,
que o tempo inventou…
13 de setembro de 2005
invisibilidades
e
desenhei,
por inteiro, o Vazio
e
a nudez de um Rio, como se a memória adormecesse sem pesadelos, nem muros-caiados-de-silêncios…
Só as sombras eram brancas, frias, (des)luadas na noite que me dormia…
Despenteadas…
Bailarinas invisíveis,
que me consomem vampiras, o sentir e o Ver...
12 de setembro de 2005
eclipse
10 de setembro de 2005
autópsia de um sonho
Desbotado!
Dissecado em memórias infantis...
Perdeu-se nas metáforas,
sem cor nem sorrisos…
Morreu!
Assim, tal qual,
num quadro de Dali,
que nunca pintou Pierrots nem Arlequins…
Morreu, Pierrot,
derretido,
deitado fora entre as folhas secas do jardim…
9 de setembro de 2005
missangas
Cresceram muito as minhas estrelas, perderam a fantasia…
8 de setembro de 2005
Notredame
Fiquei preso na ponta do arco-íris,
enamorado,
nas gotas de um bago de uva,
a tocar violinos,
e
a dançar com o vento e a chuva…
ah, soubesse ter errado os caminhos e teria encontrado o desenho pintado de Nossa Senhora Paris, numa lágrima de neve pura…
7 de setembro de 2005
fados
toca em bailados
de-di-lha-dos,
em-sons-de-sol,
a-la-dos,
numa história de encantar…
Não tem reis,
nem princesas,
nem rainhas,
nem sapos,
é fado que sente numa noite de luar.
Sal-ti-ta a musica,
leva a cor e o olhar…
Quente esta musa,
que ousa amar,
sopra a guitarra,
sozinha,
num som de embalar.
Não é sonho,
nem gaivota,
é fantasia que toca para a cigana-de-olhos-de-mar,
soltar o corpo,
e
dançar…
sal-ti-ta-a-ci-ga-na,
nas cordas bambas
desta guitarra que chora
a cantar...
6 de setembro de 2005
esquiço de uma noite
Vesti-a de borboletas…
Eu,
em silhueta chinesa, a imitar estátuas,
tocava flauta-de-Pain, para encantar estrelas que bailavam quase cisnes,
quase fadas,
quase letras…
5 de setembro de 2005
alísios
folheio a vida em soluços enleados numa aguarela cinza de sombras amarelas
e
o espelho finge-se de mim,
mas estou evaporado em silêncios que ecoam batuques-de-fogo e fumos-de-alma.
O dia esculpiu-se xistoso e o vento levou todas as cores num passeio sem retorno…
Há vozes ao longe…
Minhas.
Musicas e lamentos,
ladainhas antigas…
Só o barco me navega,
bailarino,
lento…
Já não sinto.
Inquieto-me e mergulho,
sozinho,
neste imenso vazio de um dia que se apressa mais que o vento,
sem história,
nem livro…
Só o desenho me lava,
e
leva
leve,
na ondulação das dunas,
desta linha deserta,
sem caminhos…
2 de setembro de 2005
no vermelho-sangue de terra que grita
soluçou gritos feiticeiros e emulou-se em desesperanças...
Asfixiou-se em respirares de fumos negros...
Lá,
onde o horizonte se azula,
o mar paralisou-se em tristezas e os navegares fantasmas deixaram de gerar ondas…
No fim,
o fogo suspendeu-se em queixumes de lágrimas secas e pairou impune nas nuvens sem sentidos,
nem ventos,
nem sombras,
nem destinos...
1 de setembro de 2005
hibernações do Ver
como uma gaivota que navega sem voares,
transformada em falua,
sem ventos,
nem estrelas,
nem azuis,
nem lugares…
Guarda-me a chave da gaveta…
Podes perdê-la
Tanto faz.
Vou (re)inventar tudo …outra vez...
31 de agosto de 2005
a pairar em planuras e mesmo assim, existir...
Irreconheço-me ao andar por aí sem mim.
Sem palavras,
sem desenho
nem cores.
Sou invólucro andante,
pedinte?
pedante?
Autómato de fuga,
de pausa,
de intervalo.
Suspendi-me no existir de mim.
O relógio parou...
Destemperado.
Durmo em gaveta,
baú fechado,
parado...
30 de agosto de 2005
ciúmes
o mar revestiu-se de andorinhas e de pescadores de estrelas...
as gaivotas enciumadas,
ficaram a olhar futuros,
com todos os azuis a dançar emoções numa planura serena de brisas ...
29 de agosto de 2005
quando o horizonte se refugia bem perto de nós e nos abraça desconfortado por se transmutar em muro de cinza
densa,
escura,
de cinza...
de bruma
e o horizonte fugiu…
Acoitou-se na praia, desenhado em ondas brancas,
tímidas,
medrosas…
Só ao dormir-do-sol, caíram pós-de-pirilampo,
e o mar sorriu de cócegas…
O dia fica pequeno com o horizonte tão perto do olhar.
Há uma espécie de muro na existência, que paira perene, suspenso no (des)tempo de se ser Mar,
por inteiro…
1 de agosto de 2005
ir
Chegou o tempo de ir, em sentido qualquer mas ir...
Vou procurar sentires, cores, novas linhas de horizonte.
Vou entre o céu e a terra procurar equilíbrios e harmonia.
É tempo de ser em estado puro, sem filtros, sem horas, sem espaço.
Volto com data marcada em Setembro...
28 de julho de 2005
Sim, Senhor Doutor...
Aparei a queda com o ombro que de tanto se queixar, lá me convenceu que tinha que ir ao médico. O normal era marcar consulta e ser atendido, mas como é normal ter que esperar meses sem conta, desnormalizamos o acto e toma lá Urgência com a dor que ao menos assim, mais hora menos hora temos olhos que nos vejam, radiografia tirada, e papel de receita a aviar se a dor se prolongar.
Está mal o sistema, estamos mal nós que o pomos sempre à prova com coisas de menor monta, mas saúde é saúde e ensinaram os antepassados que com ela não se brinca.
Ainda pensei em afagar as fomes, que o dia fora longo e pressentia longas horas. Não acautelei o estômago, mas um livrito levei não fossem as horas ter tamanho outro que as normais e os minutos se agigantassem.
Vivemos em sociedade, de informação e cartão magnético é coisa do dia a dia. É só pôr na ranhura e lá está o historial burocrático do cidadão. Mas este que resolveu ao fim do dia utilizar o Serviço Nacional de Saúde, mudou de morada e teve que redizer tudo de novo, de sorriso na boca e dor na omoplata.
Seguiu-se a "triagem" em sons castelhanos e novelescos e lá fui de papel branco na mão, com a queixa da maleita descrita em letra para entendidos, para sala outra, à espera de vez.
Esperei, pouco, porque esperar é estar num sitio sem nada fazer, e eu antes de pegar no livro e isolar-me do local, olhei curioso a tentar adivinhar vidas, coisa que gosto desde menino, pôr histórias nas pessoas e no tudo.
De fronte estava idosa de pele gravada de vida enviuvada, em cores negras de morte adiada. Toda ela transpirava dor, incomodação, olhando o tecto, transformado em céu, e em prece de alívio rápido. Fixei-me na pele gretada, a desenhar movimentos de vida de campo, nos amanhos da pequena horta, das galinhas, dos coelhos e das sua quatro cabras, ganha-pão de tapa-miséria precioso, que passeava mesmo com dores de afia-ossos, nos pastos secos, de terra seca. Eram o seu tesouro, as suas quatro cabras, que tratava com autoridade de pastora-viúva e de filhos emigrados…
Senhora Albertina Silva?
Sou eu, sou eu…
Apareceu um vulto alto, sisudo, de bata branca a esconder ganga-de-marca e desconder sapato italiano (que por cá não se sabe sapatear com classe), olhar de águia, austero, predador…
Quem a mandou cá?
Bem Senhor Doutor, foram as minhas dores…
As suas dores? Então a senhora, tem dores?
Tenho sim Senhor Doutor, não…
Onde? Diga onde?
Na perna Senhor Doutor, na perna, é da coluna, sabe…
Ó minha senhora, alguém lhe perguntou de onde é a dor? Se sabe de onde é vá-se embora, a consulta está feita, quem é a senhora para fazer diagnósticos?
Diagno….Senhor Doutor?
Aponte! Aponte onde é a dor!
Aqui senhor doutor.
Muito bem! Agora espere!
Muito bem ,Senhor Doutor!
( esta cena, este acto de vida, indefeso, passou-se em frente de todos, não foi na reserva de uma pequena sala, foi num corredor de espera, ao sabor das humilhações, no indecoro de uma violação da alma, no desprezo de um desafecto...).
Senhor José?
Levanto-me,( ainda com a Dona Albertina no sentir, a imaginar as preces de perdão por tratar tão mal as suas cabrinhas e por tal falha desumana, estar agora a ser ela, tratada como animal sem rosto, nem pasto de sorrisos).
Entre.
Entrei para uma sala. Intrigado. Mais intricado fiquei quando saí , porque fui bem tratado, acompanhado à porta, com desejos de melhoras.
Fiquei incomodado a pensar se seria do cartão, ou se a dona Albertina, era afinal um fantasma, indigente que por ali passara para incomodar o senhor doutor, senhor de diagnósticos profundos, que escolheu mal a profissão e que se arrasta nos corredores de um Hospital, como ave de rapina a sublimar as suas frustrações de vida…
Não sei se ainda lá está a Dona Albertina, eu já jantei, já aviei a receita e preparo-me para noite inquieta, porque o mais certo é ter visto fantasma porque humano não se trata assim , e cartão afinal é para desburocratizar e facilitar os procedimentos e saber quem paga ou não paga taxa moderadora…